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Cine Virtual: Boca de Lobo

Conto de Arlindo Kamimura
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Sinopse: A história de Brugh, portador de uma síndrome, que praticamente o obrigava a inspecionar as bocas de lobo à noite e desse modo sentir a sensação de medo e excitação que esse comportamento lhe provocava.

Boca de Lobo
de Arlindo Kamimura


Quem nunca passou por uma boca de lobo à noite, deu uma rápida espiada no negrume do seu interior e não sentiu um frio na espinha ativando a amígdala cerebral, imaginando os mais insólitos e aterrorizantes habitantes das trevas pronto para atacá-lo? Para alguns, uma simples colônia de cupins sem asas seria suficiente para provocar as mais espalhafatosas cenas de pânico explícito.  Pois bem, essa é a história de Brugh, um jovem portador de um raro vício, a síndrome de Horror quaesitor in tenebris tenebris. Para satisfazer essa mania, ou seja, buscar o medo na escuridão, portava constantemente uma lanterna LED, com a qual iluminava toda boca de lobo que encontrava nas suas frequentes saídas noturnas, especificamente para esse fim. O que buscava? Ninguém sabia e duvido que Brugh também soubesse, pois racionalidade e objetividade são as últimas coisas a serem buscadas por maníacos compulsivos. Essa mania surgira na sua mais tenra idade, ainda lactante, quando buscava desesperado, debaixo de qualquer peça de tecido, fosse a blusa de sua mãe ou um lençol, uma teta ou mamadeira para aplacar sua formidável fome. Como toda criança, geralmente evolui intelectualmente, Brugh evoluiu das exigências prosaicas do estômago para algo mais sofisticado e cerebral, ou seja, a síndrome acima citada. Essa mania era de execução solitária, uma vez que não era fácil encontrar um amigo para compartilhar as suas inusitadas expedições noturnas, empreendidas nos horários de maior escuridão e risco. Encontrava os mais estranhos seres noctívagos desde um banal ninho de ratazanas a um casal de gambás, com filhotes. 

A noite era o período também no qual Brugh vivia suas maiores aventuras, quando atravessava o portal onírico, após observar pela janela, a escuridão da rua, apenas iluminada pela abóbada celeste. Era o instante ansiosamente aguardado após suas andanças noturnas, no qual sua imaginação corria solta, sem qualquer forma de amarras ou limites, tanto espaciais quanto temporais. Sonhava ser transportado para Alpha Centauri, o sistema estelar mais próximo do sistema solar, no qual orbita um planeta com condições climáticas semelhantes às da Terra, atrelado ao lombo de uma ave de sua propriedade, com múltiplas asas, cabeça no formato cônico, olhos oblíquos, cor de fogo, bico nacarado e aquilino e  garras enormes. Por motivos desconhecidos essa ave obedecia docilmente aos comandos de seu dono, transportando-o para diferentes locais em cada noite. Em uma de suas viagens, percebe ao pousar em uma ravina pantanosa cheia de sapos voadores mortos, em decomposição, que os pelos de sua nuca se eriçam, alertando-lhe que alguma coisa lhe observava atentamente e que representava um perigo desconhecido iminente. Olha, preocupado, em todas as direções, não conseguindo identificar sequer um mísero anfíbio roedor com nadadeiras, que abundava por aqueles sítios e caudalosos rios. Isso por si só era um fato preocupante, uma vez que tais roedores, notoriamente pacíficos, jamais deixavam de lhe dar as boas vindas, cada vez que pousava no planeta. Sentiu outro sinal de alerta, este proveniente de suas entranhas, retorcendo-lhe os intestinos, avisava-lhe que o perigo estava se aproximando por trás, coleando silenciosamente pelo pântano fétido. Nesse instante, Brugh sai em desabalada carreira e observa, enregelado pelo medo, uma revoada guinchante de um bando de morcegos vampiros fugindo também daquilo que se aproximava pela retaguarda. Sabia que eram morcegos vampiros, pois possuiam pelagem curta e macia, com pele cinza-prata no dorso, ficando mais escura nas costas. Possuiam orelhas pequenas, pouco arredondadas, o lábio inferior profundamente sulcado e o nariz achatado, em forma de folha. Após sentir o término da debandada dos morcegos, Brugh olha para trás e percebe uma multidão de lesmas gigantes e velozes também fugindo em sua direção. Entretanto, como estava no momento em uma plataforma salina, as lesmas subitamente em contacto com o sal, derretiam como manteiga na pedra aquecida, formando uma pasta gosmenta aderindo aos seus pés. Uma série de animais imensos, vistos apenas em almanaques por Brugh, desfilam também lentamente, como em um cortejo fúnebre ao seu lado, todos com aparência tristonha e (des) animados, como se dirigindo ao matadouro. Por fim, Brugh toma consciência da fuga em sua direção de um rebanho de trilobites em tresloucada trajetória, colidindo entre si de maneira totalmente não racional e caótica, desaparecendo em uma névoa escura e fedorenta. Em suas andanças pela internet, Brugh encontrara imagens de alguns fósseis desse artrópode e sabia que estavam extintos há muito tempo (sabe-se, que há mais de duzentos e cinquenta milhões de anos). O comportamento confuso e desarvorado dos trilobites sendo exterminados pela “coisa”, dá à Brugh uma pista do que seria a entidade que provocava tanto terror: a tão sonhada entidade, objeto de sua permanente busca noturna e só encontrado em seus estimados e curtidos pesadelos. O sentimento de Brugh era contraditório. Ao mesmo tempo que sofria enormemente com a sensação de pavor, essa emoção provocava-lhe, também, um enorme prazer. Daí, vinha-lhe, provavelmente, a carência e necessidade de suas incursões noturnas e das “viagens” oníricas.

Brugh possuía discernimento suficiente para perceber o nível de imprudência e despropósito que sua atividade noturna exigia, mas não se conhecem argumentos racionais suficientes para mudar a cabeça de um alienado. O que todos temiam aconteceu quando Brugh iluminou sua última boca de lobo e, definitivamente, encontrou finalmente o que estava procurando.                          

Conto escrito por
Arlindo Kamimura

CAL - Comissão de Autores Literários
Agnes Izumi Nagashima
Gisela Lopes Peçanha
Pedro Panhoca
Rossidê Rodrigues Machado

Produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


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