Antologia A Magia do Natal: 8x09 (Season Finale) - WebTV - Compartilhar leitura está em nosso DNA

O que Procura?

HOT 3!

Antologia A Magia do Natal: 8x09 (Season Finale)

Conto de Liah Pego
Compartilhe:

 




Sinopse: O  texto mostra Ana lembrando da infância enquanto tenta explicar aos netos o que é “ser desperto”. Conectando passado e presente ela ensina que despertar é enxergar a vida com mais amor, consciência e carinho. No fim, todos entendem que o Natal verdadeiro está na luz interna de cada um.

8x09 - O Desperto (Season Finale)
dLiah Pego

O tempo passa. A vida segue seu rumo, e as pessoas despertam — ou não — para um futuro promissor ou de escassez, carregando dentro de si crenças limitantes herdadas de seus antepassados.

Assim refletia Ana, sentada na varanda de sua casa, observando à sua frente, os últimos raios análogos de sol que ainda insistiam em pousar no verde do jardim. Fazendo pausa para refletir sobre a leitura do livro “O Despertar da Consciência, de Neville Goddard.” Seu pensamento a levou de volta à infância, na pequena cidade onde vivia com seus pais e mais três irmãos. Lembrou-se de que, nas noites de inverno, reunida ao redor da fogueira — e disputando um espacinho quentinho com o orvalho teimoso e incessante — sua mãe costumava contar histórias da própria vida escolar quando ainda era adolescente na única escola da vila onde morava.

 Era uma época em que não havia transporte escolar para levar os alunos até a escola. Ou ia-se de carroça, ou no carro da própria família — quando esta tinha recursos para tanto — ou, às vezes, a pé mesmo.

 “De onde a professora Amélia tirou aquela palavra?”, pensava Ana, divertindo-se com a própria memória. Era um termo incomum na época, e o conhecimento literário era escasso para uma população tão pequena daquela pacata cidade. Ana tentava conectar o presente ao passado e ria sozinha.

Ela continuava pensando, fazendo analogias entre o ocorrido e a leitura que realizava, observando o livro apoiado no banco ao seu lado. Recordava-se bem das narrativas da mãe. Respirou fundo, ajeitou-se no banco da varanda e puxou da memória a vida escolar da adolescência de sua mãe. Por algum motivo — talvez saudade, talvez pura imaginação fértil — decidiu entrar na pele dela, como se pudesse viver aquele passado emprestado.

Imaginou-se então contando a história para seus netos. Preparou seu “canto imaginário”, ajeitou a postura como uma contadora profissional e colocou-se à disposição para ouvi-los, mesmo sabendo que eles raramente esperavam a vez para falar, porém, estava disposta a passar por aquela experiência.

Começou sua narrativa — ou melhor, a narrativa de sua mãe — até que a voz infantil, cheia de curiosidade e pouca paciência, interrompeu:

— Vovó Ana, o que é “desperto”? — perguntou Pedrinho, segurando o dinossauro de pelúcia pela pata, como se o bichinho também quisesse a resposta.

Vovó Ana respirou fundo, encarou o neto e, num piscar de olhos, incorporando com maior veemência a própria mãe, Dona Conceição, deixou a imaginação passear pelos cantos empoeirados da infância, catou memórias como quem recolhe resquícios de cinzas deixadas das fogueiras caídas no quintal. Ajeitou os óculos no rosto e então iniciou: 

— Alguns anos atrás, numa pequena cidade do interior, existia uma escola, uma professora e seus alunos. Os preparativos para o Natal já tinham começado. Cada família apresentava o que havia de melhor para a ceia. Não existia essa quantidade de presentes como existe hoje, não… A oração e o agradecimento eram o marco da religiosidade que predominava em cada lar. A igrejinha chamava os fiéis com aquele som de sino que parecia estar com pressa.

— É! — interrompeu Laura, de sete anos, num gesto tímido, arrumando com as mãos o cabelo longo, preso num rabo de cavalo — meus pais falam que as pessoas de hoje não comemoram o Natal como deveriam.

— Deixa a vovó continuar a história! — retrucou Gracinha, apertando o ursinho contra o peito como se ele também estivesse ouvindo tudo. — Continua, vovó… quero saber tudinho sobre sua vida na escola.

A avó abriu um sorriso largo, deliciando-se com o momento aconchegante com os netos, quando percebeu mais um membro chegando para a festa e sentando-se ao seu lado:

— Papai! Você também veio! — gritou uma das crianças, interrompendo a narrativa bem na hora em que o pai, num gesto rápido, levou o dedo indicador aos lábios, dando permissão silenciosa para que a mãe continuasse.

Ana então retomou:

— Professora… o que é despertar? — perguntou Joaquim, o garoto mais admirado da sala que, apesar disso, era ridicularizado por vários colegas. A palavra era desconhecida e desencadeou risos em alguns, curiosidade em outros. Questionamentos internos surgiam na cabeça de muitos, enquanto a professora permanecia imóvel diante do quadro-negro.

Segundos depois, ela se virou para o retângulo escuro atrás de si e escreveu:

 O Desperto...

Todos nós lemos em silêncio a escrita.

— Conseguem ler e entender? — perguntou ela, com o olhar firme passando de rosto em rosto. Aos poucos, aqueles olhares entreabertos foram ganhando forma. As respostas vieram em acenos de cabeça, trocas de olhares, mãos tapando a boca… e outros ficaram no silêncio absoluto. Podia-se ouvir o eco do silêncio que pairou no recinto, em cima de nós.

— Vamos ler juntos — disse ela, voltando o corpo e o contato visual para o quadro. Com uma régua que media quase um metro, apontava para cada sílaba.

Des- per-to.

Apesar de a sala ser composta por adolescentes, ainda havia aqueles que carregavam limitações para compreensão e sofriam discriminação — inclusive da minha parte. 

Era tempo de preparativos para o Natal, quando a escola parecia cheirar a giz, pinheiro e expectativa...

 Passados alguns minutos de explicação, a professora lançou um desafio para que pesquisássemos o significado da palavra “desperto”. Foi como se ela tivesse jogado não um balde de água fria, mas um de água gelada — quase congelante — sobre todos nós. Os burburinhos surgiram sem controle, tornando o restante da aula um campo eletromagnético. — Me lembro como se fosse hoje

A sala inteira prendeu a respiração — alguns por interesse, outros por puro pânico. 

Toda a turma entrou em desespero. A professora havia lançado um desafio daqueles capazes de fazer até o aluno mais esperto pensar em fugir pela janela.

Cada fala, cada reflexão, cada contestação dos colegas de sala — ou melhor, daqueles que ousavam contestar, já que na atual época, quase não se permitia intervenção por parte dos educandos. Porém, a mestra Amélia era exceção. Bastava o interesse dela pelo assunto para torná-la, aos olhos dos alunos, uma pessoa desperta para a vida e para o futuro.

— Por que aquele moleque fez essa pergunta? Agora estamos ferrados! — reclamavam uns para os outros no recreio. 

— Como vamos encontrar isso?!

— Que vontade de dar uma surra de cinta naquele sujeito…

— E a vovó, como reagiu? — perguntou alguém, curioso.

— Tal qual os outros: nervosa, preocupada, porém confiante. Lembrei que poderia ir até a biblioteca — um ambiente onde eu nunca tinha colocado os pés. Isso me fez pensar que talvez fosse estratégia da professora para nos ensinar a caminhar atrás dos nossos próprios objetivos.

— E como vocês fizeram pra pesquisar sobre isso, vovó? — perguntou Sérgio, o neto mais velho, aquele que se orgulhava de ser o “responsável” da turma. Era tão estudioso que até o dinossauro de pelúcia do Pedrinho parecia olhar para ele com respeito.

 Ela ajeitou os óculos e endireitou a postura. Mergulhou tão fundo na lembrança que parecia ter voltado à antiga sala de aula, com a mãe. Pensei em perguntar para meus pais, mesmo sabendo que, apesar da pouca leitura, carregavam um extenso conhecimento de vida — daqueles que não vêm nos livros, mas nas experiências do cotidiano. Sendo assim, todas aquelas informações que precisávamos descobrir vieram dos pais, dos vizinhos e da minúscula — e única — biblioteca da cidade. Um lugarzinho apertado que colecionava antigos jornais, revistas e livros deixados por viajantes. Tudo ficava lá, quieto e empoeirado nas poucas prateleiras, como se as histórias também estivessem esperando alguém que finalmente as despertasse assim como eu, que queria ser desperta...

— Mamãe!

— Sim! — prontificou-se ela, ao ouvir o filho — ainda usando um gorro de Papai Noel torto na cabeça — chamar sua atenção para retomar os assuntos já comentados. — Acredito ser importante explicar para seus netos a relação entre o despertar e o Natal.

— Sim, vovó! Queremos saber como era o seu Natal! — insistiram as crianças, como plateia ansiosa. — Fala mais um pouquinho! — Fala!

A avó respirou fundo, fez uma breve pausa teatral, pegou o copo ao lado e tomou outro gole d’água como quem vai anunciar um grande segredo. Depois, ajeitou o próprio gorro natalino — que teimava em escorregar — e percebeu que alguns dos presentes a imitaram, ajustando seus gorrinhos também, como se aquele fosse um ritual oficial das histórias da família.

Então, retomou a fala, agora com um sorriso maroto que prometia mais encantamento:

— Como eu dizia antes... O sentido de “presente de Natal” quase não existia. O foco mesmo era a união da família com os vizinhos e a religiosidade. Crianças corriam pelos espaços enormes das casas e quintais; a mesa vivia repleta de comidas compartilhadas, e — naquela época — não havia amigo secreto... nem discreto! — brincou ela, arrancando risos de todos e dissolvendo o clima tenso.

A última frase dita serviu de entretenimento para todos os presentes, que caíram na risada.

— As brincadeiras eram meu momento predileto — completou ela.

— O meu também! — salientou Aninha, sentada no meio do círculo, distraída com sua coleção de bonecas. Com sua vozinha de três anos — provavelmente sem entender nada do que estava sendo contado — conseguiu arrancar gargalhadas gerais. Principalmente da avó, encantada com a performance inesperada da pequena.

O esforço da risada, porém, trouxe um leve engasgo, desencadeando uma rápida crise de tosse. Assim que o desconforto passou, ela aliviou a garganta com o liquido incolor depositado no copo em cima da mesinha ao seu lado, pigarreou aliviada, recuperou a compostura e continuou a narrativa com o sorriso ainda estampado no canto da boca ajeitando novamente o gorro de Papai Noel que insistia cair para o lado. 

— No meu tempo, o Natal era bem diferente. Não tinha shopping enfeitado, nem lista de presentes. O que a gente tinha era família junta, vizinhos rindo alto, mesa cheia de comida simples... e vontade de abraçar o mundo.

As crianças se entreolharam, curiosas.

— Mas e o “desperto”, vovó? — insistiu Laura, ajeitando seu cabelo de lado.

— Ah, isso! — disse a avó. — Ser desperto é acordar por dentro. É enxergar o Natal com o coração, e não só com os olhos. Não é só ganhar presente... é perceber quando alguém precisa de um abraço, de um sorriso, de ouvir “eu te amo”. Entender o Natal não como uma obrigação social, mas encontrar oportunidade de conectar consigo mesma e com as outras pessoas. 

— Tipo quando o João divide o chocolate comigo? — perguntou Marcos, desconfiado.

— Se eu divido meu lanche na escola, ajudo um amigo que está triste, abraço o outro por algo que ele perdeu… tipo assim, eu estou sendo desperto e compartilhando o verdadeiro sentido do Natal, igual Jesus viveu? — perguntou o amigo de João, que também estava ali, curioso e meio orgulhoso da própria teoria.

— Exatamente! — respondeu ela, rindo. — O Natal é isso: gente juntinha, compartilhando o que tem. Uma pessoa desperta consegue ver o que realmente importa: amizade, generosidade, carinho e gratidão.

Jesus deixou pra gente um ensinamento muito especial.  A mensagem cristã do Natal celebra seu nascimento, símbolo de recomeço e renovação: uma luz que insiste em furar a escuridão da alma e acendendo a do coração. 

Portanto, celebrar o Natal de forma desperta é um convite silencioso, compreendendo que o sentido da data não está nos presentes, tampouco no brilho das luzes de pisca-pisca, mas na luz que cada um decide acender dentro de si.


Os netos ficaram em silêncio por um instante, como se estivessem tentando “acordar do sono profundo.

— Ufa! — suspirou João, passando as mãos pelo cabelo como se estivesse desembaraçando também as ideias. Procurou as palavras, fez uma careta pensativa e, por fim, perguntou: — E no seu tempo tinha tanta correria assim, vovó?

— Correria tinha... mas era atrás das crianças que fugiam da ceia para brincar no quintal — disse ela, piscando. — Hoje a correria é atrás de promoção! Cada época com seu sufoco.

E todos caíram na risada. 

— E a vovó se arrepende por isso? — perguntou Marcos, que até então só observava e ficou boquiaberto com a revelação da avó.

— Isso o quê? — respondeu ela, franzindo as sobrancelhas, demonstrando não entender muito bem do que se tratava.

— Por ter debochado… provocado… rido dos alunos com dificuldade de aprendizagem e deficiências físicas— completou o menino, escolhendo as palavras, só para garantir que a vovó não resolvesse dar uma lição de moral.

— Muitíssimo! — respondeu ela, ajeitando os óculos pela terceira vez. Hoje eu entendo que esse tipo de atitude se chama bullying.

 — Já aproveitando a pergunta do Marcos… como foi mesmo o desfecho da pesquisa? — lembrou Suzan, passando a mão pelos cabelos grisalhos da vovó com carinho e satisfação.

Então, chegou o dia da revelação. Nem todos conseguiram expor — por vergonha, timidez, ou simplesmente por não terem encontrado explicação nenhuma. Ainda assim, a professora elogiou o esforço de todos, até daqueles que não apresentaram nada.

— Aprendemos também no silêncio — disse ela no final. Na hora, questionei se ela dizia aquilo só para acalentar quem não fez o trabalho… e confesso que isso me frustrou. Não compreendi o sentido das palavras dela. Hoje, refletindo sobre tudo, percebo que nossa linguagem era pobre, mas suficiente para gerar compreensão. 

— Se eu tivesse que apresentar hoje algo sobre a palavra desperto, eu diria: Desperto é aquele que ama, vibra no amor, na paz, na alegria, no sucesso e felicidade

É aquele espiritualmente leve, com pensamento límpido, capaz de romper crenças limitantes. É orgulhoso de si mesmo; enxerga os outros com empatia, ignora os julgamentos alheios.

Compreende que a gratidão é o pilar essencial para cocriar a riqueza.

— Uau, vovó! Onde aprendeu tudo isso? — perguntou João, meio acanhado, como se ela tivesse acabado de revelar segredos vindos de outro planeta. Seu comentário, seguido por aplausos dele e dos demais, fez a avó erguer as sobrancelhas com a elegância de quem já esperava pela plateia. Sua resposta veio a seguir:

— Lendo bastante e conversando com pessoas sabias — disse, exibindo um sorriso alegre.

— Quero ser uma pessoa desperta! — Completou Marcos, arrancando risos de todos ali presentes. 

— Então, meus amores — concluiu a avó — ser desperto no Natal é lembrar que a luz mais importante não é a da árvore... é aquela que acendemos dentro de nós mesmos.

Os netos se apertaram em volta dela, como se tivessem entendido direitinho.

E, só para confirmar, Aninha perguntou:

— Vovó... então posso acender minha luz agora?

— Pode — respondeu ela, beijando a testa da pequena. — E que ela brilhe o ano inteiro.

A avó Ana permaneceu sentada, observando a pequena fila que se formou para lhe oferecer beijos e abraços de agradecimento. Um por um foi saindo, até que o último, ao fechar a porta, fez um estardalhaço capaz de arrancá-la do transe em que estava.

Ainda piscando para voltar ao presente, ela percebeu alguém chegando com várias sacolas de compras balançando nas mãos — A presença chamou sua atenção de imediato.  Em seguida, gesticulou apressada tentando ler os lábios de alguém. 

A voz familiar ecoou da parte baixa do primeiro degrau da escada que dava acesso à varanda, com aquele tom que já anunciava novidade:

— Ana, minha filha! Você observou o cozimento do peru que deixei no forno para a ceia de Natal?

Ana levantou os olhos, usando a língua de sinais disse — Esqueci completamente. Tomara que não tenha queimado...

A mãe fazia sinais com uma mão enquanto tentava segurar suas próprias sacolas com a outra e caminhava em direção à entrada. Ela abriu a porta, e as duas adentraram sorrindo, apoiando-se pelos ombros.

Ana, ainda meio sem graça, explicou, que estava sentada na varanda, “incorporada” na própria mãe — dona Conceição — contando aos netos as histórias que ela, havia ouvido. A mãe entendeu tudo e soltou um riso abafado.

— Foi bom? — Perguntou com humor a mãe, usando sinais com as mãos, uma vez que, era a única forma como Ana se comunicava. 

Dona Conceição puxou o assado do forno. O cheiro escapou quente pela cozinha, abraçando o ambiente com aquele perfume inconfundível de Natal. Ana respondeu com um gesto afirmativo, aliviada ao perceber que, ao menos daquela vez, o peru sobrevivera à sua distração.               

Conto escrito por
Liah Pego

Tema de abertura
Jingle Bell Rock

Intérprete
Glee

CAL - Comissão de Autores Literários
Agnes Izumi Nagashima Gisela Lopes Peçanha Paulo Mendes Guerreiro Filho Rossidê Rodrigues Machado Telma Marya

Produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO



Copyright 
© 2025 - WebTV
www.redewtv.com
Todos os direitos reservados
Proibida a cópia ou a reprodução

Compartilhe:

Antologia A Magia do Natal

Episódios da Antologia A Magia do Natal

No Ar

Comentários:

0 comentários: