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A Deusa Bandida: Capítulo 14

Novela de Carlos Mota
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A DEUSA BANDIDA - CAPÍTULO 14

Aurora deixa a varanda e vai em busca da garota, cujas forças minguam a cada grito de socorro que liberta de dentro do próprio coração. Acompanhada à distância por Luizinho, a cigana não demonstra felicidade no que faz; assim como um vaso de vidro, algo dentro dela trincou, permitindo que enxergasse o que o dinheiro lhe havia ocultado. Ah, o dinheiro! Claro! Sempre ele! E por ele, ela deixou Sousa, deitou-se com o patrão, comprou o que tanto almejava, curtiu o prazer de ter tudo e todos ao alcance das mãos, desafiou os próprios limites e só não terminou morta em Piracaia, porque os oráculos a protegeram. Sim! Ela havia abandonado os seus, sem olhar para trás; mas eles a queriam de volta… Sentia isso!

Os apelos da mãe junto às rezas do pai chegavam-lhe por meio da brisa, que iracunda, desajeitava-lhe o cabelo, até chegar aos ouvidos, onde eram entregues, no intuito de que a fizessem regressar. Ela não estava sozinha, como imaginou, e que alegria isso lhe causava. Aos poucos, a cegueira despertada pela ganância dava-lhe a exata dimensão do erro que havia cometido ao abandonar a família e os costumes de seu povo, que ainda corriam-lhe nas veias, protegendo-a das armadilhas do destino.

Quanto mais se aproximava de Luara, mais distante sua mente se encontrava, como se tivesse atravessado um portal, regredido no tempo, de onde era possível revisitar momentos importantes de sua vida.

Em um deles, com as bênçãos da lua, aos pés de uma fogueira, sob o som de instrumentos artesanais, exibia-se em um vestido longo, com babados às pontas, costurado com todo esmero pela mãe, uma sexagenária que encontrava na natureza o sentido da própria existência; com os cabelos encaracolados caindo sobre os ombros até encontrar a cintura, o colo e os braços adornados por bijuterias de todos os tamanhos e formas, ladeada por homens e mulheres de várias gerações, Aurora dançava, conectada ao Sagrado e à alegria. Os movimentos soltos da alma dialogavam com os mistérios, com a essência da Deusa Interior. As cores vivas de suas vestes, o bater dos pés ao chão, as mãos e o rosto para o alto, eclodiam a sensualidade e a força feminina, que tanto encantavam os presentes.

E foi numa dessas noites intensas que avistou Luizinho, em meio ao horizonte, como um Romeu às avessas em busca de sua Julieta. A atração foi imediata! Mesmo sendo um criminoso perigoso, ele se mostrou um homem doce com as palavras, selvagem na cama, persuasivo quanto ao futuro e isso a encantou, porque por mais que amasse dançar com os seus, a pobreza estava por todo lugar, e fugir dali era uma obsessão; aproveitou sua chegada para que pudesse atravessar as fronteiras familiares e conhecer o mundo tão desejado, regado por todos os prazeres mundanos, que só o bandido poderia lhe proporcionar.

Mas como tudo tem prazo de validade, seu encantamento logo virou servidão e sua paixão, apenas lembranças. Sua função, a partir de certo momento, limitava-se a alertá-lo quando o mal se aproximava; era o seu amuleto ou cão de guarda, como ele mesmo gostava de contar aos comparsas. E viveu por muito tempo com a escuridão dentro da alma, sem vontade para mais nada, com seus poderes – todos os que aprendeu com seus avós –, voltados para o crime.

E quando se deu conta de tudo isso, sentiu uma enorme vergonha, mas não havia o que se fazer. Estava envolvida até o último fio de cabelo com a família do Português e, um passo em falso, acabaria enterrada viva.

No auge da arrogância, chegou à loucura de liderar um bando

de criminosos no assalto a um banco. Onde estava com a cabeça? Não tinha a menor ideia! Mas com Luizinho à sua espreita, sentia-se, ao mesmo tempo que provocada, irradiante; e o que ele mais queria eram os seus poderes e a serviço dele.

O assalto tornou-se um caos e só não acabou numa valeta, estiraça como tantos outros, porque o mesmo bandido que a seduziu, convenceu o homem de que os prejuízos seriam ressarcidos. Como? Somente com o sangue de uma inocente. E assim planejaram o sequestro.

Mas o que jamais imaginou era que durante a fase de implantação, seria atraída por um jovem que lhe roubaria os sentidos. Um verdadeiro botão de rosas em meio ao deserto, que deveria ser cultivado com todo o carinho e protegido das ervas daninhas que o cercavam. Assim como o Pequeno Príncipe, de Exupéry¹, ela tinha o seu botão, a quem gentilmente tratava por Álvaro, e por ele se tornava eternamente responsável.

E agora, diante da garota, ainda que demonstrasse pena, tinha a possibilidade de exterminar a “peste” que corrompia os sentidos de sua rosa. Bastava atirar-lhe alguma magia para que fosse dessa para uma melhor, deixando o caminho livre para que conquistasse o coração do bandido… Não! Não! Espere aí… que culpa tinha Luara de Álvaro a amar? Longe do feitiço de Luizinho, Aurora conseguia, finalmente, distinguir o certo do errado, como lhes ensinaram seus familiares. Então, o que fazer?

— Não me ma-mate, po-por favor! — implorava a filha dos Vaz, encurralada, após escorregar no jardim. — Eu imploro!

Luara estava a seus pés, toda maltrapilha, com o ferimento gotejando sangue, bastava um simples gesto seu para que ela definhasse como as flores no inverno… Sem ela, o caminho estaria livre, Álvaro seria todo seu. Apenas SEU! E que prazer não sentiria? “Nenhum! Deixe-a em paz!” — respondia uma voz que ecoava de dentro de seu coração.

A confusão de sentimentos a perturbava, a ponto dela se perder no olhar da garota, que parecia espelhar todo o sofrimento de Sara Kali, a serva de Jesus, que se viu obrigada a deixar Israel por conta das perseguições aos judeus. Abandonada em um barco à deriva, sem remo, com alguns outros, ela rezou e pediu a Deus que chegassem a salvo em terra firme, prometendo, caso atendida, espalhar em vida a palavra do Evangelho. E não é que a graça foi concedida! Assim como Sara, Luara era firme no desejo de sobreviver. Então como matá-la? Não conseguia, por mais que quisesse.

— Não me-me ma-mate, por favor!!! — a voz quase inaudível comove a cigana, que ofega, com as mãos contidas.

— Por que Aurora não a detém? — pergunta Luizinho, na varanda, vendo-a receosa diante da vítima. — Que diabos ela está fazendo? Prenda-a logo, antes que alguém possa vê-la — determina o homem. — Vamos, mulher!

E ao invés de machucá-la, a cigana lhe estende as mãos, para o espanto da filha de Martim, que continua retraída, em lágrimas profundas.

— Venha! Não tenha medo! Vou ajudá-la! Venha! Dê-me sua mão!

Aos poucos a neta de Beatriz toca a mão de Aurora, que invadida por energias estranhas, sente o corpo estremecer, os lábios secarem e a cútis perder o brilho; os olhos reviram, agitados, até enegrecerem; os sentidos lhe escapam e são capturados pelos espíritos da terra, que lhe urram aos ouvidos e lhe projetam parte de um futuro abjurador. Apavorada com a criatura que se levantava diante de si, Luara tenta se libertar, mas a força da cigana é surpreendente. Com os dedos lendo as linhas da palma de sua mão, Aurora enxerga o mal que ressoará do coração de uma flor machucada, ora caída aos seus pés, que se levantará como Diana, a deusa romana da lua e da caça, poderosa e forte, que vagará pelas noites feito uma fera em busca das vítimas que lhe saciarão a fome. Impiedosa e sarcástica, destilará seu perfume inebriante e letal pelas ruas da selva de pedra, ludibriando os ingênuos, sorvendo a essência dos que se acham espertos, estraçalhando e devorando os que lhe ameaçarem a existência. E seu rugido, como símbolo da onipotência, será ouvido em todos os cantos da terra, para o desespero dos homens, que tentarão contê-la, mas mil cairão ao seu lado e dez mil à sua direita e ela não será atingida. Temida pelos honestos e agraciada pelos senhores do crime, assim nascerá A Deusa Bandida, o ser supremo que atormentará a humanidade, principiando o fim dos tempos.

— Não me mate!!! — implora Luara, soltando-se da cigana, que se segura para não cair.

— Deusa Bandida?!! Não!!! Não pode ser!!! — comenta, consigo mesma, reavendo as energias. — As forças da Natureza devem estar equivocadas. Ela… ela não pode ser… ser… a responsável pela morte de… de Álvaro. Não! — os olhos enfurecidos são tomados de lágrimas, levando-a, num momento de desvario, a esbofetear a garota, que se defende, pedindo ajuda. Aurora parecia querer vingar-se da morte do amado, que continua vivo, sob a mira de Egídio, no quartinho.

A lâmina do punhal corre superficialmente a garganta de Álvaro, que sangra; o pior só não acontece porque Egídio é surpreendido por algumas palavras proferidas pelo bobalhão:

— Elisa… Elisa… me disse tudo!

— Hã!!! Do que você está falando? — atormentado, ele é repelido com um empurrão.

Contendo o sangramento com as mãos, Álvaro tenta se safar da sanha assassina do companheiro, que o quer a qualquer custo, principalmente agora, que lhe encheu a cabeça com dúvidas.

— Fale, verme!!! Faaale!!!

— Eu sei de tudo, cara!!!

Rodam o quarto, um ameaçando o outro, o que cometesse o menor erro, levaria a disputa.

— TUDO O QUEÊ??? E POR QUE ELISA LHE CONTARIA ALGUMA COISA???

— Ela tinha medo de que você enlouquecesse, como de fato aconteceu…

— EU VOU TE MATAR!!!

— Pois faça isso, quando todos souberem da minha morte, de algum dos presídios que passamos, uma carta chegará ao poder do patrão, que após a leitura, o fuzilará sem pensar duas vezes.

Egídio recupera o controle diante da ameaça.

— Não estou entendendo nada…

— Elisa sabia que esse dia chegaria e me armou com todas as provas possíveis para derrubá-lo, cara.

— Você está querendo me confundir… Que história é essa? E o que minha mulher tem a ver com isso???

— Já disse, eu sei de tudo!

— Tudo o quê??? — brada.

— Foi você quem entregou o patrão e sua quadrilha à polícia, em Sousa, a pedido do Português, que queria vê-lo morto.

— HÃÃÃÃÃ!!!!!! CO-CO-COMO ASSIM??? — angustia-se. —

Isso é mentira!!!

— Não é!!! E quando ele souber, você será abandonado em uma vala, com a cabeça estourada por uma rajada de tiros. Quer apostar?

— Vo-vo-você só pode estar blefando…

— Então me mate e aguarde o seu destino, que será muito pior que o meu.

— E… e por que Elisa lhe diria isso? A não ser que… — especula.

— … ligou os fatos?

— Não! Não pode ser! — revolta-se. — Eu matei o cara…

— … o cara errado, ainda não percebeu? Sua mulher era minha quando você se aventurava pelas ruelas do crime.

O bandido ruge de fúria.

— Está querendo me confundir… Só pode!

— Nunca! Você matou o cara errado! E eu o instiguei a fazer isso, lembra-se? Enchi-lhe a cabeça para que acreditasse que aquele coitado desse conta mesmo do fogo de sua biscate.

— Não, ele estava com Elisa.

— E o que você viu? Um homem buscando uma moto roubada, numa arapuca que eu mesmo engendrei, para que deduzisse que ele fosse o amante de Elisa? Você é tão previsível! Não pensou duas vezes, encontrou o cara na casa e pensou que era ele que lhe colocava galhos na testa… e então lhe passou fogo!

— Mas ela tentou defendê-lo!

— Você não conhecia mesmo sua mulher, ela tinha a alma boa, apesar de se deitar ao seu lado. Tentou apenas impedir uma injustiça e acabou também baleada. Não percebeu o quão abalado eu fiquei ao saber da morte dela? Imbecil demais! Inventei uma boa desculpa e caiu como um pato. Até o mais burro dos burros teria sacado, mas você, só enxergava o que eu queria

— Ela mentiu para você — tenta desacreditar as palavras da mulher. — Eu nunca fiz parte de qualquer tocaia contra o patrão.

— Verdade? E contra a cigana? Também não? Foi você que novamente delatou o crime à polícia, precisava pôr um fim nela e nos comparsas, mas não contava com o poder dela, não é?

— Eu não sabia de cigana alguma…

— Como não? Todos sabiam de sua existência, mas nunca a tínhamos visto, o patrão a guardava, como se fosse um brinquedinho seu.

As palavras de Álvaro conduzem o bandido a um passado não tão remoto, em que, na companhia de Elisa, naquele casebre feito de barro, bem nos cafundós do Brasil, nus como vieram ao mundo, após fazerem amor, ele comentava:

— E logo estarei no topo da cadeia, basta pôr um fim no patrão, como mandou o Português. Ele está cheio do idiota e quer lhe mandar para o quinto dos infernos, mas de modo sutil, para que a bandidagem não se rebele. Apesar de frio, metido como se tivesse o rei na barriga, Luizinho é venerado pelo crime, e qualquer ação um pouco mais evidente, poderá causar um racha na Família, por isso, o correto será apagá-lo por meio de um “coxinha”… A coisa será tratada com naturalidade, sem maiores reveses.

— E isso não é perigoso? — pergunta a mulher, de pele vistosa, unhas pintadas com vários tons de vermelho, olhos castanhos, cabelos mais negros que os de Iracema², corpo bem-feito, beirando 1,75 de altura.

— Não! Na hora “h” eu não participarei do assalto ao banco de Sousa, terei de alegar uma crise de labirintite ou algo do tipo para enganar os idiotas e, a partir do momento que entrarem, deverei acionar um contato nosso na polícia local, que encherá o lugar de viaturas e meterá bala, pondo um fim à vida do “camaleão” mais procurado de todos os tempos. Ele cairá e eu me levantarei, como prometeu o Português, assumindo todas as suas operações na Família. Hum! Não vejo a hora disso acontecer! Vou lhe dar o mundo, mulher!

Mas as coisas não acontecem como previsto, Luizinho é salvo por Aurora, despertando a ira do Português, que toma uma atitude inesperada, ao apoiar a cigana em suas pretensões dentro da organização. E o que deveria ser um salto, termina como um voo de galinha. Aurora deveria morrer, para que Luizinho também caísse e o lusitano, detentor de todas as frentes, fosse o único Deus a ser cultuado no Olimpo.

— E assim faremos, mulher, entregaremos a cigana e seu bando; com a queda dela, virá a do patrão, tão desejada pelo Português. Desta vez eu estarei lá, bem de perto, para que nada fuja ao controle… A casa vai cair!!! — enche-se de arrogância.

Elisa acende um cigarro, sentada a uma cadeira de balanço, sem dizer uma só palavra.

— Confie em mim, lhe darei uma vida de princesa, minha querida!

Mas, diferentemente do que imaginavam, a cigana se safa, ainda que isso custe o sangue de todos os outros.

— Caralho, a puta se salvou! — indigna-se Egídio. — O Português está em brasa, para mandar nos aniquilar, basta um simples estalo…

— E você não disse que a apagaria, caso algo falhasse? — pergunta Elisa.

— E quem disse que eu a vi? A bicha é fogo, mexe com magia, tem o poder dos espíritos, pelo menos dizem; pra mim, ela é filha do própria capeta! Só você vendo, ela desapareceu do nada, como se a terra abrisse um buraco e a escondesse… Rodei tudo que é canto! Mas o Português cobrará os prejuízos da operação, mesmo sabendo que o patrão não terá como pagá-los. E aceitará o plano do sequestro proposto, com a certeza de que não dará em nada, porque a família do general, apesar de influente, não conseguirá levantar a quantia necessária, pelo menos no tempo que ele dará para que seja executado — gargalha. — Você está diante do cara que tomará o lugar do patrão. E logo será a dama do crime!

Egídio retorna à realidade ao tomar consciência da pergunta de Álvaro:

— Só não contava que ela estivesse loucamente apaixonada… e por mim! Não é?

— Eu vou te esfolar vivo…

— Vai nada — diz, com o sangramento contido. — Se fizer algo contra minha vida, pagará com a sua! Adoraria ver a cara do patrão ao saber de sua traição, infeliz. As peças do tabuleiro viraram, agora quem manda na partida sou eu, entendeu, seu BURRO? Para quem me julga bobalhão, até que sou bem espertinho, não é mesmo? — escarnece.

O bandido aperta os punhos a ponto de as mãos roxearem. Enquanto isso, na mansão dos Vaz…

— Não consigo o dinheiro, Matilde, e só temos até amanhã para pagar o resgate. O que fazer? Se Leonor souber, vai ficar mais pirada do que já é.

— Tenha fé, senhor, algo de bom há de acontecer para que a menina volte para casa sã e salva — tem a esperança de que Eufrásio delate Solano, a tempo de a polícia invadir o cativeiro e a resgatar com vida.

— De onde tira tanta esperança? Minha filha vai morrer, mulher!

— Não vai não, eu sinto dentro de mim…

— Vocês, mulheres, são estranhas… — desabafa o general, abatido pelas circunstâncias.

— Estranhas, por que, Melanciiia? — pergunta a matriarca, achegando-se. — Olhe como fala, a gente representa a nooova geração, meu filho, né, não, Cleeeide?

— Com certeza! — responde, vindo atrás da patroa. — E que geração! E a senhora é a líder dela. Olhe estas imagens — mostra-lhe o celular —, não são de arrepiar?

— Pode crê! Nunca vi tanto favelaaado na vida… Aff! — despreza. — Arrastõõões cariocas em plena capital!!! Deviam era meter essa cambada no xilindró, mas as forças policiais, de uns tempos para cá, não sabem mais o que é prender.

— Dona Leonor, é o povo de Ceilândia fechando a rodovia…

— Que loucuuura!!! E a fecham por quê? Com certeza querem aumento do Bolsa Família, só pode! Trabalhar ninguém quer, né? Pobre é tudo igual! — coça o nariz. — É só dar uma oportunidade para que essa gentalha surja do nada e afane nossos bolsos. Hum! Vou falar a verdade, rico sofre neste país. É o que mais trabalha e o que é menos valorizado.

— Ô, dona Leonor, a senhora está lesa da cabeça? — brada a empregada, para a surpresa da patroa, que a repreende.

— Com queeem pensa estar falando, piooolho de gente? Está despedida e sem direito a fundo de garantia! Mulherziiinha ingrata!!!

— Essa gente está lá por conta da senhora.

— CO-COMO? — arrepia-se, tendo mais um daqueles arrotos de grandeza.— POR MIIIM???

— A senhora se esqueceu que eles iriam protestar para que o Boninho a aceitasse no BBB???

— Ops!!! Pois é Verdaaade!!! VIRGI! É pooovo de todo lugar!!! Veja, veja, tem mais gente que nas motociatas do presidente… — sorri com gosto. — E escute o grito de guerra — toma o celular das mãos da empregada —, escute: 

“OR, OR, OR, QUEREMOS LEONOR
NA TV E NO VT,
LEONOR NO BBB!!!” 

— Estão até pensando em lançar a sua candidatura ao Senado

— completa a fofoqueira.

— SENAAADO??? EEEUU??? Tá vendo, Melancia, tô com a moral, o povo maravilhoso de Ceilândia me ama, assim como o Brasil também me amará.

— Povo maravilhoso??? Ué, mas não foi mesmo a senhora que os chamou de favelados há pouco? — confronta Matilde, inconformada.

— EEU??? Nuuunca!!! Essa gente mora no meu coração! — vira- se para a cozinheira. — O que não faz a inveja, né, não, Cleeeide??? Alegria de uns, choro de outros. Sai pra lá, Satanás!

— Oh, dona Leonor, a senhora não pode… — Matilde inicia um bate-boca, mas é silenciada por Martim, que pede para que não entre na pilha da mulher.

— Tá, vendo, Melancia, esta daí mooorre de inveja de meu glamooour… Pudera, feinha e desajeitada desse jeito, quem vai dar bola? — pisoteia. — Já comigo a coooisa é diferente, basta eu passar pra “negaiada” assobiar, pedir bis; já não aguento mais beijar o povão, o beiço tá até inchaaado. Que diiia, meu Deus!!! Imagine eu no BBB, Cleeeide?

— A senhora iria tirar o atraso.

— Que atraaaso, minha filha??? O Melancia é desse jeito, sem sal nem açúcar, mas ainda comparece… E ai dele se falhar, meto-lhe um gaaalho na cabeça.

— LEONOOOORRR — interrompe o general, sendo contido por Matilde, que teme por sua saúde. — Essa mulher está cada vez mais doida. O que eu fiz para merecer tal castigo?

— Cada um tem o seu fardo, senhor! — responde a mulher.

— Sai pra lá, coruuuja velha! Vá cuidar de sua vida! — Leonor não perde a oportunidade de ofender a governanta. — E quanto a você, Cleeeide, está readmitida e com um bom aumento.

— Meu Deus! — lamenta Matilde, observando a cara de felicidade da enxerida, que nem disfarça mais suas táticas. — Quanta sorte, né, Cleide? — provoca.

— Dona Leonor sabe do que é bom, né, não, futura senadora???

— SE-NA-DO-RA??? Sim!!! Sim, claro! Claaaro!!! — orgulha-se ao ouvir novamente o povo gritar o seu nome.

O telefone interrompe a conversa.

— Sim! Pois não, delegado! Como? Eufrásio, preso? Mas por quê? — questiona Martim.

Minutos depois, na delegacia…

— Eu sabiiia, esse motoristazinho nunca me enganou. Com essa cara de pobre, fedendo a suor, o que se havia de esperar? Pois cadê minha filhiiinha, seu desnaturado??? — exige a mulher, ainda mais louca, diante do chofer, que estava sentado em uma cadeira desconfortável, algemado.

— Acalme-se, dona! A senhora não pode fazer deste espaço público uma extensão de sua casa. Vamos com calma! — repreende Enrico.

— Dona Leonor — chama Cleide, de lado, presente no local, a pedido da patroa. — Posso transmitir esse babado? A galera ia adorar, os cortes viralizariam.

— Cê acha, Cleeeide???

— Claro! A senhora seria mais comentada que a Ana Maria Braga… Se a senhora deixar, abro uma live já, tá fácil de me conectar ao wi-fi da delegacia, sabe como é, pobre não tem dinheiro para comprar dados móveis.

— Que horrooorrrrrr!!! Usar wi-fi desse lugar??? Nunca!!! Eu lhe rotearei o sinal.

— A senhora capriche, podemos chegar a milhões de visualizações.

— MILHÕÕÕES??? Mande bala, minha filha! Estou bem arrumada? E a pintura da cara, ainda está em pé? Este calor está de matar!

— ESTÁ MA-RA-VI-LHO-SA!!!

As palavras da empregada soam-lhe como aplausos, deixando-a ainda muito mais atrevida.

— Eu não fiz por mal, senhores, meu filho… — o motorista tenta se explicar.

— Sempre soube que você não prestaaava, Eufrásio, mas a veeelha, digo, a minha sogra querida gostava de você, tá aí o resultado, apunhalou-nos pelas costas… — Vira-se para a empregada, cochichando: — Ficou bom? Precisa de mais força nas palavras?

— Imagine!!! Interpretação digna de um Óscar.

— Ó-ÓSCAR??? — os olhos brilham.

— Deixe o pobre falar, Leonor, este barulho está atrapalhando

— reclama Martim, incomodado com a conversa paralela.

— Para fora vocês duas! — manda o delegado, ao perceber a live.

— Fora! Isso é o cúmulo!

— Eu quero é fiiicar!!! Minha fiiilha está em perigo e precisa de mim…

— … bem longe dela, com certeza — completa a autoridade policial, expulsando a patroa e a empregada da sala. — Desculpe, seu Martim, mas essas duas me enlouquecem. Não sei como o senhor aguenta. Mas vamos ao que interessa, a esta altura, os policiais estão a caminho de Brazlândia, se tudo der certo, o tal Solano será enjaulado e poderemos, enfim, descobrir o mandante do sequestro e o possível local do cativeiro.

autor
Carlos Mota

com ilustrações de
Andrea Mota
 
elenco
Luara
Álvaro
Aurora
Diana
Martim Vaz
Leonor Moreira Vaz
Beatriz Vaz
Matilde
Cleide
Eufrásio
Sofia
Luizinho como Patrão e Camaleão
Egídio
Enrico
Português

trilha sonora
Immortal - Thomas Bergensen
 
produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


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