
No
capítulo anterior, Carlito é encurralado pelos tukurás, o mundo sofre com a
distorção do tempo, Imã resgata o senhor Belchior, vô Táquio consegue puxar
Drica para dentro da ciranda, Tiana fica sabendo do acidente com Rui.
CAPÍTULO 17 - SEIS MINUTOS MAIS VELHO
Dentro
do tronco de um velho angelim-vermelho, Cuca se distrai com o pequeno objeto
que tem entre os finos dedos retorcidos. A ciranda se movimenta de um lado a
outro, brilhando de tal forma que parece hipnotizar a velha maga.
—
Afinal, o que você é? Por que não me obedece?
Cuca
é descendente da linhagem das magas, de onde herdou o conhecimento da magia. Em
princípio sua função era contribuir para o equilíbrio de um mundo harmonizado,
mas foi seduzida pelo poder, acabou se corrompendo e passou a cobrar
recompensas pelos serviços. Porém, como todo apetite desordenado não se
satisfaz, em uma das experiências conseguiu criar um ser capaz de manipular
corações e mentes. As possibilidades que pôde vislumbrar com tal descoberta
foram tantas que sentiu tristeza por não ter mais do que esse mundo para
conquistar. Por isso, quando soube que estranhos de outra dimensão estavam
hospedados em um reino próximo, não teve dúvidas de que precisava saber de onde
vinham e como chegar ao reino deles.
Mas,
os planos foram frustrados por Táquio que, além de se livrar das cirandas,
ainda sequestrou sua criatura, desencadeando uma onda de violência e
destruição. Pois, por mais que tentasse, nunca mais conseguiu repetir o
sucesso.
Carlito
acorda assustado, não consegue mover um dedo sequer. Já esteve nessa mesma
situação antes, portanto decide poupar energia, apenas mexe com os olhos para
tentar conhecer o local.
Apesar
da visão embaçada, dá para perceber que o cômodo é circular, sem janelas, nem
inscrição nas paredes, uma fina neblina baixa dá a impressão que o chão se
mexe, a iluminação é precária, alguns vagalumes presos no teto, como estrelas
em um céu enegrecido, mas, o que o deixa mais preocupado é a ausência de
vigilância. “Será que confiam tanto em
suas armadilhas?” Carlito se lembrou da superforça e decide arriscar, dessa
vez com mais confiança.
A
dificuldade para se mexer é imensurável, mas, ele desiste quando ouve passos se
aproximando.
—
Já está acordado?
Cuca
aparece, escoltada por dois tukurás, Carlito pensa em falar, mas não consegue.
—
Então, como faço isso acontecer? Como eu uso esses objetos para chegar ao seu
mundo?
O
silêncio que toma o ambiente é inquietante. Embora, Carlito não responderia
mesmo se pudesse. Cuca, é impaciente, mas não burra.
—
Por que ainda não abaixaram o caldo? — Ela grita enfurecida.
Os
tukurás dedilham em torno do corpo do rapaz e a substância vai desgrudando aos
poucos, como uma casca de banana. A liberdade de movimento é uma sensação
inebriante, semelhante a tirar o pé de um sapato apertado. Carlito cai de
joelhos para tomar fôlego, a família de Beron vêm na memória, despertando uma
fúria que o deixa quase irracional. “Carlito, pense em voltar pra casa, só isso.
O que tá feito, tá feito.”
—
Está pensando em usar sua força contra mim? — Cuca demonstra confiança
circulando o rapaz.
—
Não, eu não pretendo te atacar.
—
O que pretende?
—
Eu já disse, quero achar o Conde E e dar o fora desse mundo louco. Já estou
aqui há muito tempo.
—
E se eu te disser que o Conde E já voltou para suas terras?
—
Como você sabe?
—
Acha que só ele tem espiões?
—
Se for verdade, então eu não tenho mais nada a fazer aqui.
—
Vai voltar também?
—
Sim, mas…
—
E pode me levar contigo?
—
Acho que sim… não sei, na verdade. — Carlito se levanta.
—
Guardas?
Os
tukurás seguram Carlito pelos braços e o levantam no ar. A dor que sente o faz
gritar. Sem conseguir se defender, ele descobre que não possui mais a força de
antes. Os gritos de dor não comovem Cuca.
—
Você sabe como parar com a dor, não sabe?
Carlito
grita novamente.
O
amanhecer é cinzento, apenas pelo relógio biológico de cada um é possível
perceber que não é mais noite.
O
céu está coberto por nuvens negras, o vento abafado contribui para um cenário
desolador. Dentro do abrigo, todos acordam e se empenham em suas rotinas, os
filhotes choram com fome, os mais velhos murmuram dores de enfermidades, mas o
alívio está além de suas possibilidades, pois as ervas que servem de antídoto
estão dentro do Reino Negro, constantemente vigiada por tukurás e a dona, a
maga Cuca, não admite que seja subtraído nem uma raiz de suas terras.
No
abrigo, Imã e Drica acordam e procuram por Táquio, mas seu avô está reunido com
Gualbe e outras criaturas.
—
Olá Espoletinha, bom dia. Bom dia Drica, conseguiram dormir bem?
—
Oi, vô. O que tá acontecendo? — Imã se aproxima do grupo e abraça seu avô.
—
O Gualbe está me explicando que eles precisam se deslocar, esse lugar ficou
perigoso e está me mostrando as rotas e lugares para que todos possam se
acomodar.
—
Olá, vô Táquio. — Drica também se aproxima. — Mas, a gente não vai com eles,
né?
—
Infelizmente, Drica, para eles, tempo é um luxo que não dispõem. Todos estão se
preparando para a partida o mais rápido possível.
—
Mas, vô… eu não posso concordar em sair assim.
—
Espoletinha, eu entendo a urgência de vocês, mas entenda que esse povo precisa
ser protegido, eles não sabem nada de defesa ou ataque. Sem uma liderança que
saiba enfrentar as dificuldades e orientar o que fazer em tempos de guerra, não
existiria mais nada aqui. Olhe em volta, você acha que posso deixá-los assim,
sem nenhuma proteção? Essas manobras de deslocamento exigem muito planejamento
e logística, o Gualbe está me mostrando as melhores rotas que podemos seguir,
Devemos demorar algum tempo, mas depois, prometo que irei atrás do seu amigo.
Não se preocupe com ele, a Cuca não irá fazer mal, porque precisa dele e é isso
que o manterá vivo.
—
Mas, a gente podia agora… né? — Drica gesticula uma partida.
Táquio
não responde. Gualbe pede atenção novamente.
—
Sim, já vou. Agora, vocês vão por ali, deve ter alguma coisa para se
alimentarem um pouco.
As
meninas são puxadas por um filhote para outro cômodo, enquanto Táquio continua
a reunião.
—
Imã, o que será que seu avô está aprontando? — Drica cochicha.
—
Não sei, mas tenho certeza de que voltaremos sem ele.
—
O que? Mas, então toda essa encrenca que estamos passando não vale de nada?
—
Não é isso, Drica, é porque ele só pode sair daqui quando nós estivermos junto
a ele no hospital. Quando voltarmos pro meu apartamento vou precisar da sua
ajuda, eu tenho que estar perto dele de qualquer jeito.
—
Ah, é. Esqueci que precisa ter o contato da ciranda com o vô. Caramba, que
coisa mais complicadinha. Apareceu o tal Belchior, a gente entrou na ciranda,
pulamos outros mundos, nos separamos, reencontramos, perdemos o Carlito,
achamos o vô Táquio e agora estamos aqui, no meio de uma guerra, sem a menor
ideia de como se proteger e salvar nosso amigo.
Imã
suspira entristecida. Um jovem aparece ao lado das meninas com um belo sorriso
no rosto.
—
Bom dia, Princesa Macar, Bom dia Lady Drica.
—
Senhor Belchior, como se sente? — Imã se alegra com a chegada do amigo.
—
Estou melhor, Princesa, obrigado por me salvar.
—
Eu não te salvei, apenas o segurei para não cair no chão.
—
O que seria fatal para mim, pois já não tinha forças.
—
Senhor Belchior, sabe como podemos encontrar nosso amigo Carlito?
—
Não, Lady Drica, infelizmente, não sei. Mas, vocês já viram como está o Conde
E, não era isso que buscamos? Ainda assim, não acho boa ideia ficarmos por
aqui, pois sei que a Cuca é poderosa e pode nos atacar a qualquer momento.
Aconselho a retornarmos o mais rápido possível para o seu castelo, no outro
mundo. Aqui não é seguro.
—
Não, senhor Belchior, nós não sairemos daqui sem meu cavaleiro. Foi para isso
que viemos.
Belchior
abaixa a cabeça.
Tiana
é uma religiosa fervorosa, por conta disso sempre teve autocontrole das
emoções, nunca perde a esperança mesmo em situações mais graves, desde que
soube do acidente com Rui não cessou de pedir orientação e proteção para o
menino. Ela chega ao hospital uma hora após sair de casa, o lugar não é tão
distante, mas o trânsito atrapalhou um pouco. Como não podia ser diferente, o
ambiente é organizado e a recepcionista é prestativa, informa o quarto do
paciente e mostra a direção.
Por
mais crente que fosse, Tiana jamais seria capaz de imaginar o que estava ali
bem na sua frente. Ela se preparou para o pior, afinal o menino sofreu um
atropelamento e, segundo o que o porteiro contou, a coisa foi feia. Certamente,
ela não pensou que seria um cenário bonito, estava num hospital da rede privada
e a situação parecia gravíssima. Assim que entra no quarto do rapaz, toma um
susto ao ver o próprio Rui de pé, com um sorriso apático, talvez um pouco mais
magro e cabelo diferente, mas o mesmo Rui que deveria estar, no mínimo, todo
remendado e não aquele garoto estendendo a mão para cumprimenta-la.
—
Muito prazer, sou o Renê, seis minutos mais velho que o Rui.
Tiana
leva alguns segundos para entender a situação.
—
Meu Deus que susto, desculpe, meu filho eu pensei que…
—
Está tudo bem, já me acostumei aos espantos, eu e meu irmão não costumamos
dizer que somos gêmeos, quando nos veem pela primeira vez é sempre a mesma
surpresa.
Renê
volta para o lado do leito. Rui se encontra sedado, a cabeça enfaixada, partes
do corpo com bandagens e feridas em todo rosto, além de máscara insuflando
oxigênio. Ao lado do leito tem um monitor de vida piscando regularmente,
indicando que o estado de saúde é estável, apesar de ainda inspirar cuidados.
Tiana não consegue reter uma lágrima de dor. O jovem se levanta para atendê-la
e fala em voz baixa.
—
Obrigado pela visita.
—
Ó, meu filho, eu mal conheço o Rui mas o sinto como se fosse da família.
—
É bom conhecer os amigos do meu irmão..
—
Prazer, sou a Tiana, ele é amigo da minha menina, a Imã.
—
Acho que eu falei com a Drica por telefone, fui até um pouco grosso. A senhora
quer ficar sozinha com ele um pouco?
—
Ah, não, não, serei breve, A Drica é outra amiga dele, mas isso não importa
agora, quero que saiba que estamos torcendo por seu irmão, nós o amamos muito,
ele vai sair dessa.
—
Vai sim, os médicos estão muito esperançosos, o Rui é meio esquisito, mas
também durão, nos disseram que ele foi assaltado por dois marmanjos, o nosso
pai conhece gente na polícia, eles vão pagar. A gente não sabia que o Rui
sofria ameaças porque sempre deu jeito nos problemas sozinho. O meu irmão vai
voltar ainda melhor que antes.
—
Meu filho, permita deixar um presente que ele gostou muito e pode ser que ajude
um pouco? — Tiana se aproxima do leito com uma ciranda e a coloca na mão de
Rui, antes de se afastar, dá-lhe um beijo na testa.
Renê
apenas observa em silêncio respeitoso.
— Fica com Deus. — Tiana se despede entre lágrimas.

M. P . Cândido
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Carlos Mota
Bruno Olsen
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
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