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Antologia Nosso Amor: 1x03 - A Tempestade

Conto escrito por Fabíola Colares
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Sinopse: História de amor entre duas mulheres, marcada por uma tragédia.


1x03 - A Tempestade
de Fabíola Colares

O tempo fechou e os raios iluminavam o céu enegrecido. O barulho dos trovões era um prelúdio da chuva que estava por cair e o vento forte balançava as árvores com violência trazendo as lembranças que vinham com a mesma força da tempestade que estava sendo anunciada.

Andava rápido para chegar logo em casa antes que desabasse o aguaceiro depois de um dia exaustivo, mas ao mesmo tempo tão cheio de esperanças.

Trabalhava todo dia num ritmo enlouquecido para dar conta dos prazos que desabavam na minha cabeça sem trégua. Nesses últimos dias me enterrei até no limite para não pensar em mais nada senão nas coisas que tinha para fazer.

No final do ano as coisas pareciam ainda mais complicadas do que no início. Mas ainda bem que tenho com que me ocupar. A descoberta de novos poços no estado vizinho me deixava sempre atarefada.

Minha vida sem ela não tem sido nada fácil. Esquecer todas as emoções que vivemos está realmente complicado. É claro que as coisas passam e a dor cessa depois de um tempo. Mas achei que não seria capaz de superar essa dor por tê-la perdido de maneira tão estúpida.

Namoramos por anos e vivíamos felizes convivendo com as nossas impossibilidades de maneira madura e real. Nos últimos tempos as mudanças que ocorreram foram ainda maiores que as mais complicadas do início quando não fazíamos a menor noção de onde vinham tantos sentimentos até então inéditos para nós. Passadas as dificuldades iniciais a convivência era maravilhosa e tranquila. Anos de harmonia nos fizeram saber que nada no mundo era suficientemente forte para nos separar. Brigávamos às vezes, mas não com frequência. Nem nos demos conta de como surgiram os primeiros desentendimentos que acabaram trazendo um desgaste enorme para o nosso romance que até então era perfeito. Frivolidades, discussões sem sentido, coisas que não levavam a nada. Se pudesse voltar no tempo deixaria para sempre as coisas tolas pelas quais brigávamos tanto.

Mergulhada durante meses num misto de dor e lembrança, fui tentando superar a sua morte que aconteceu no momento em que vimos a possibilidade real de sermos novamente felizes.

Estávamos voltando de uma boate onde comemorávamos o aniversário de casamento de uns amigos e a decisão de reatar o nosso. Inevitavelmente tínhamos que passar pela Linha Vermelha. Já era bem tarde e como ali é sempre barra pesada, procuramos não parar praticamente em nenhum cruzamento. Eu estava dirigindo, os vidros estavam fechados e ela olhava o porta-cd’s buscando algo para ouvirmos. Tínhamos feito as pazes no dia anterior e a felicidade de compartilharmos momentos juntas nos deixava num envolvimento ainda maior. Todos os nossos amigos tinham torcido ou colaborado para a nossa volta.

Num dos cruzamentos foi impossível não parar. O movimento era muito grande e tive que esperar no farol vermelho. Ela me contava alguma coisa que havia acontecido nos meses que passamos distantes quando de repente um cara, de mais ou menos uns vinte anos, armado, parou em frente ao carro enquanto outros dois, um de cada lado, nos obrigava a abrir os vidros. Pedi que obedecesse e destravei os vidros abaixando-os para ver o que os garotos queriam. Pediram as nossas bolsas, dinheiro, o som e o que tivesse mais de valor dentro do carro. Muito nervosa, tentou conversar com o rapaz pedindo que não nos matasse e que entregaríamos tudo, o que quisessem, sem problema nenhum. Abaixou-se para pegar as bolsas tentando acalmar o garoto que estava com a aparência de drogado e a arma apontada para a cabeça dela. O outro me mandava ficar quieta e com as mãos no volante. O nervosismo dos três era notório e tínhamos medo do pior.

Obedecia, completamente em pânico, com medo que perdessem a calma e atirassem em nós. Ela não parava de tentar acalmar o rapaz, pegando as coisas para entregar ao assaltante que pressionava a arma com mais força.

As coisas aconteciam numa fração de segundos e não via a hora de tudo aquilo acabar para sairmos dali.

Entregou minha bolsa e com a dela no colo começou a abrir o fecho para colocar as coisas dentro. O rapaz, muito nervoso, achou que tentaria uma reação e desferiu um soco no rosto dela que praticamente caiu no meu colo com o impacto. Ergueu-se com o nariz sangrando muito e quando ia entregar a bolsa, o rapaz disparou um tiro na têmpora.

Ele enfiou a mão dentro do carro, pegou a bolsa e saiu correndo.

Os outros dois completamente atônitos por causa do que tinha acabado de acontecer, correram também, olhando para trás, como que arrependidos pelo que o outro fez.

Demorei uns segundos para ter alguma reação e olhar para ela que tremia deitada no meu colo, com a cabeça bastante ensanguentada e quase sem conseguir respirar. Desesperada falava o tempo todo que tudo ficaria bem e que aguentasse; a ajuda chegaria logo.

Pessoas que passavam na hora pararam para socorrer e uns dez minutos depois a ambulância, o corpo de bombeiros e a polícia chegavam ao local. Ela estava inconsciente mas ainda de olhos abertos balbuciava palavras que eu não conseguia entender. Segurava firme a minha mão e me olhava com os olhos quase sem vida, respirando com muita dificuldade.

Os socorristas perguntavam se também tinha sido atingida por estar toda suja do sangue dela. Respondia que não pedindo que eles a socorresse logo.

Tiraram-me do carro para que pudessem apoiar a cabeça dela e retirá-la com muito cuidado. O ferimento sangrava sem parar e a palidez do seu rosto dava a impressão de boneca de louça.

Deitaram-na numa maca que estava no asfalto e ali mesmo começaram os primeiros socorros. Oxigênio, massagem cardíaca, verificando pulsos, pupila, pressão arterial. Mas infelizmente não respondia a mais nada. Tinha perdido completamente todos os sinais vitais. Ainda segurava sua mão que aos poucos foi amolecendo e não mais senti qualquer sinal de vida nela. Um dos médicos me ergueu pelos ombros com suavidade dizendo que infelizmente ela não estava mais viva. Nada mais podia ser feito.

Em choque, muito nervosa, mas bem controlada, dava as informações, números de telefones para poderem avisar às famílias, chamar alguém para ficar responsável pelo carro e tomar as providências para a liberação do corpo.

 O corpo dela no carro de bombeiros e eu no da polícia depois que meu irmão chegou e ficou responsável por tirar meu carro do local e resolver todas as burocracias com a polícia de trânsito.

Passei por alguns exames e me deram um tipo de remédio que me acalmou. Mas ainda assim me deixava completamente sem acreditar no que tinha acontecido.

Quando meus pais e os dela chegaram ao hospital, estava sentada sozinha na maca da enfermaria e só assim me senti segura para chorar toda aquela dor e angústia que me consumiam de maneira avassaladora num desespero inconsolável.

A família dela, consternada, me abraçava e chorava comigo enquanto meus pais também me abraçavam.

Desde o início sabiam que namorávamos e nunca foram contra. Morávamos juntas, tínhamos as nossas vidas independentes e sempre fomos aceitas por todos. Nunca sofremos qualquer tipo de preconceito nem por nossos parentes nem por qualquer pessoa. Mesmo por que os sentimentos que tínhamos eram tão maravilhosos que só traziam luz para todos que puderam presenciá-los.

Depois do velório e da cerimônia de cremação sentia que minha vida não mais teria sentido sem a presença dela que tanta alegria me trazia. Passei meses sem tocar nas malas, nas coisas que havia trazido para nossa casa algumas horas antes do acontecido. As fotos, os momentos que compartilhamos com tanto amor ficaram praticamente intocados por seis meses. Dormia abraçada com o travesseiro dela e não passou uma só noite que não chorasse pela morte e pela falta que sentia. Como era difícil não ver aquele sorriso, ouvir a gargalhada, a voz melodiosa...

Achava que não era possível acordar pela manhã e ter a certeza de vê-la ali ao meu lado tão doce me dando bom dia e vindo me beijar com aquele ar de menina manhosa que precisa de colo e de carinho que tanto me deixava enternecida.

Ela era linda e doce. Os cabelos negros e curtos, a pele branca, o ar de moça rebelde com suas roupas modernas e ar descolado, a boca macia e linda, um caráter e um senso de justiça extremamente raros nos dias de hoje. Trabalhava como psicóloga voluntária num centro de apoio a crianças com HIV e dava aulas à noite numa faculdade para o curso de pós-graduação em psicologia ambulatorial. Sempre alegre e linda, fazia tudo com amor e dedicação abrindo mão às vezes do próprio bem estar para dar apoio a quem precisasse.

Minha seriedade e um tanto quanto austera, buscava na nossa convivência cheia de amor o equilíbrio para dar a ela a mesma alegria que me fazia sentir.

Estava fazendo pós-graduação em química e o trabalho na refinaria me tomava praticamente todo o tempo e humor. Algumas vezes passava embarcada quinze dias e mal tinha tempo de telefonar para ela que ficava me esperando em casa sozinha.

Quando chegava sempre tinham flores espalhadas pelo apartamento e um jantar maravilhoso. Ficávamos namorando e fazendo amor até bem tarde e pela manhã, antes de sair para trabalhar, levava café na cama, me enchendo de beijos e de carinhos.

Sempre fomos uma para outra tudo o que esperamos de um amor. Em oito anos de união praticamente não brigávamos.

Um dia, quando cheguei de um período de embarcamento de quarenta e cinco dias ininterruptos, ela estava completamente mudada. Impaciente e nervosa me recebeu de mau humor. Estranhei e perguntando o que tinha acontecido ela falou que não suportava mais essas minhas ausências prolongadas que sempre a deixavam em completa solidão.

Daquele dia em diante passamos a brigar com frequência e qualquer coisa era motivo para que perdêssemos a paciência uma com a outra. Alguns meses depois as brigas ficaram insuportáveis e ela saiu de casa voltando a morar com os pais.

Nesse período que ficamos separadas, arrumou uma namorada e eu fiquei sozinha esperando que as coisas se resolvessem o mais breve o possível.

Três meses foi esse tempo que passamos longe, nos encontrando apenas nas festas de amigos comuns, que tentavam nos reaproximar de qualquer jeito. Ficava sabendo das coisas através deles. Ela não havia me esquecido e não estava feliz com a outra namorada.

Numa dessas festas, foi sozinha e acabamos fazendo as pazes, voltando para o nosso apartamento na mesma noite.

Marcamos com os amigos que comemoravam o aniversário de casamento para comemorarmos também a volta do nosso.

Pela manhã, saiu de casa bem cedo me dizendo que ia procurar a outra menina e terminar tudo. Depois passaria na casa dos pais para pegar as coisas e voltaria rápido.

Chegou pouco antes de eu terminar nosso almoço, com as malas, as caixas e todas as coisas que tinha levado quando foi embora, radiante de felicidade. A recebi cheia de amor e carinho, abraçando-a como se fosse a primeira vez depois de tanto tempo longe.

Almoçamos e passamos o resto do dia abraçadas no sofá da sala, namorando e ouvindo música enquanto uma bela tempestade se formava no final da tarde.

Exatamente como a de hoje, que me faz lembrar de cada detalhe com a certeza de que tenho que superar essa dor que me acompanha desde a morte dela.

Depois dos acontecimentos, da tragédia, passei a fazer parte de um grupo que luta contra a violência e apóia pessoas que passaram por momentos traumatizantes e perdas de parentes ou amigos assassinados. Lutamos por mudanças nas leis do país para que a punição seja justa e eficiente para os que comentem tais crimes, exigindo das autoridades o cumprimento dessas leis com mais austeridade. Nos unimos de forma a darmos completo apoio uns aos outros.

Foi exatamente numa dessas reuniões que fiz amizade com uma moça que tem me ajudado a superar os momentos difíceis. Ela perdeu o irmão assassinado numa briga de trânsito.

Hoje, depois do trabalho e da reunião, saímos para tomarmos um chope e conversarmos um pouco. Ela acabou dizendo que estava interessada em mim e que não podia mais esconder isso já que sentia a reciprocidade dos sentimentos. Isso era verdade. Depois de alguns meses convivendo com ela passei a sentir um grande afeto e não tentei impedir que notasse esse carinho que nascia. Um sentimento tão doce, surgindo assim de forma tão inusitada, encheu meu coração entristecido pela perda de esperança e vida.

Andando de volta para casa, no final da tarde depois de nos despedirmos, olho para o céu negro e sinto a tempestade cair forte, como naquela tarde que passei os últimos momentos com meu grande amor.

Agradecida e com lágrimas nos olhos, sinto minha alma lavada pela chuva que cai como se fosse exatamente para lavar o meu espírito de todas as tristes lembranças.

Renascem a esperança e as emoções sentindo que são prêmios para me fazer esquecer da dor e lembrar que a esperança de amar novamente é tão certa.

A tempestade cai e minha vida recomeça. Estou pronta para ser feliz de novo.


Conto escrito por
Fabíola Colares

Ilustração do Desenho
Attílio Colnago

Produção
Bruno Olsen
Cristina Ravela


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO



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Sinopse: Mariana é uma estudante muito focada e inteligente, buscando o melhor para o seu futuro. Entretanto, todas as suas conquistas lhe fizeram um tanto quanto arrogante, imaginando que ninguém poderia ultrapassa-la. Diante de um novo campeonato de xadrez da escola, ela se depara com uma sedutora desafiante chamada Rafaela. Será que Mariana permanecerá inabalável diante dessa misteriosa aluna ou será enfim sua queda?


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