
Sinopse: Tudo o que Jade e Gael mais desejam é a liberdade de amar um ao outro. Porém, esse amor tão puro é posto à prova no ambiente em que vivem. Duas aldeias próximas declaram guerra e vivem sob ataque durante anos. Em meio ao caos, o amor do casal precisa florescer — e ser tão forte quanto os golpes de enxadas e foices.
3x06 - Amantes em meio à Guerra (Season Finale)
de Charlotte Thomas
Em uma época onde a tecnologia não existia, as cidades ainda estavam em desenvolvimento e as maiores invenções humanas eram uma novidade, um grupo, consideravelmente grande, andou por quilômetros e mais quilômetros em busca de um lugar melhor para morar. Vagou pelas estradas de terra, pela rodovia, pela floresta e até pelas montanhas. Eram cidadãos que queriam sair da cidade principal em busca de independência própria. Esse grupo firmou os pedaços de maneira e amarrou as primeiras barracas em um solo ainda não remexido pela ação humana. Não havia dono ainda. Dessa atitude, fundaram-se duas espécies de aldeias que almejavam se tornarem grandes cidades. Os líderes do grupo dividiram-se e cada um ocupou uma parte do terreno. Dessa divisão surgiram as aldeias D’ouro e a Oliveira D’água, pequeninas e humildes, ali pelas beiras do Espírito Santo.
A aldeia D’ouro ficava mais próxima ao chamado Rio Doce, o maior e mais límpido da região que os moradores puderam encontrar, suas margens tinham solo fértil para a plantação de diversos alimentos. Além disso, era desse lado do território que se encontrava uma grande quantidade de ferro e ouro, material usado para fazer as ferramentas usadas nas plantações. Naquele tempo, os aldeões ainda não tinham muito conhecimento do valor do ouro, então ele não era visto como matéria preciosa, era só um material para fundir e criar picaretas e enxadas. O que importava mesmo eram os alimentos: os legumes, as frutas e as verduras que cresciam do solo e podiam matar a fome – ouro não tinha esse poder. E isso, por outro lado, era algo escasso na aldeia Oliveira D’água. Essa tinha muitas árvores frutíferas e pouco solo fértil para plantações deste tipo, comparado ao da aldeia vizinha; as árvores, entretanto, eram mais altas, davam mais sombra e podiam ser usadas para a criação de móveis. A Oliveira D’água ficava mais afastada do Rio Doce, mas seus pequenos riachos estavam repletos de peixes saborosos, diferente do rio vizinho, que tinha peixes de carne dura. Sendo assim, após se firmarem no solo, os “líderes” de cada aldeia entraram em um acordo de união: dividiriam tudo. Mas como o egoísmo e ambição são sentimentos entranhados no ser humano, este acordo não permaneceu para sempre. Houve desentendimento, abuso e briga de poder, no final, cada um foi para o seu lado, tendo que sobreviver com o que tinha, e a ideia de uma união foi por água abaixo. Dez anos depois, o clima havia piorado ainda mais; aconteceram episódios de roubos, pequenas invasões e brigas entre seus povos. Assim criaram uma barreira com portões e cercas de madeira para delimitar o território; adotaram a ideia de fronteira. A aldeia D’ouro desejava as árvores e os peixes saborosos do lado vizinho; a Oliveira D’água desejava o solo fértil e os minérios por lá encontrados. Mas nenhum líder daria o braço a torcer, eram homens carrancudos e orgulhosos, era mais fácil tomar à força do que fortalecer a ideia de convergência.
Quem sofria com isso eram os aldeões; alguns eram influenciados pela mente do líder, já outros desejavam a união e tinha aqueles que só queriam ser livres para amar. Era o caso de Jade e Gael. Ambos vieram bebês com os primeiros povos e cresceram juntos. Eles tinham apenas dez anos quando a primeira briga veio à tona – a separação definitiva. Eram unha e carne, brincavam juntos, dançavam juntos e, mesmo na inocência da infância, se apaixonaram juntos. Após a separação, foram obrigados a conviver às escondidas, entre pulos de cerca e esconderijos secretos. Isso por que Jade pertencia ao povo Oliveira, e Gael, ao D’ouro. Em nenhum momento um desistiu do outro, pelo contrário, a paixão só aumentou. Entretanto, nada poderia seguir tão bem para sempre – quando os dez anos da separação definitiva se passaram, uma nova briga, muito pior, espreitava pelos cantos.
— Sabe que não precisa ir sozinho, pai. — Jade protestou, segurando uma cesta repleta de maçãs. Estavam nos fundos de sua casa, o quintal era basicamente a floresta densa que ficava atrás. Seu pai, Alberto, se preparava para mais uma expedição. — Posso ajudá-lo.
— Você já ajuda, minha filha. — Ele ergueu um pedaço de papel com instruções. — Basta seguir o caminho e encontrarei o ferro.
— E se perder o papel? Não seria melhor que eu fosse junto?
Alberto bufou, mas não respondeu. Se despediu da filha, pegou sua bolsa e desapareceu por entre as árvores.
— Deixe-o, Jade. Sabe como é teimoso. — Sua mãe surgiu da porta da cozinha. O cheiro de frango assado preenchia o ar. — E ele tem razão, você já o ajudou bastante, fique aqui onde é mais seguro.
Após a separação dos povos, cada aldeia precisou sobreviver em meio a certas dificuldades, entretanto, um fator de extrema importância viria a aparecer em breve. Ao longo do tempo, os aldeões da Oliveira D’água passaram a notar que suas mulheres, em especial as meninas que nasceram e cresceram sobre aquela terra, eram especiais. Logo depois veio a confirmação: eram mulheres mágicas. As crianças conseguiam prever catástrofes, saber o dia de chuva, o dia de Sol forte e até quando algum agouro iria contaminar as casas. Jaqueline, da família Souza, previu que seu irmão iria ser contaminado com uma doença desconhecida e deixou claro que caso alguém entrasse em contato com ele, sofreria junto. Todos ficaram assustados, menos o pai, que cismou em contrariar a filha. O resultado: pai e filho não resistiram. O filho piorou, e o pai foi contaminado ao ficar no mesmo quarto. Até o enterro foi difícil, os aldeões precisaram seguir à risca as ordens da filha para que ninguém mais fosse junto. Depois do acontecido, houve uma comoção geral que chegou aos ouvidos do povo vizinho; o líder testou as suas mulheres também, porém não adiantou. Apenas as mulheres da Oliveira D’água tinham o dom. Logo foi considerado solo sagrado, e as meninas que cresciam tornaram-se dádivas dos céus, sendo protegidas da inveja da aldeia vizinha.
Jade não era diferente; seu pai era soldador e penava para encontrar matéria-prima, ela então ouvia a natureza, sentia o pulsar do solo e conseguia ver onde havia minério. Passou a dar as coordenadas ao seu pai, assim como também sentia uma vibração maior de um lado do pequeno riacho que banhava a aldeia – era lá que os peixes se escondiam. Seu dom despertou com 16 anos, quatro anos antes daquele dia, e desde então ela precisou se proteger das invasões que começavam a ocorrer. O clima entre as aldeias havia piorado já nesta época, o líder D’ouro decidiu declarar guerra e constantemente invadia o terreno vizinho querendo conquistar não só suas riquezas, como também seu povo. Queria as mulheres mágicas. Elas previam as tempestades naturais, o que significada se precaver e evitar perdas, e sabiam ouvir a natureza, o que ajudava na caça e pesca. O povo da Oliveira D’água conseguia conter as invasões e, em contrapartida, também planejavam investir contra o inimigo. Uma guerra estava claramente declarada, uma bomba relógio prestes a explodir. A casa de Jade não fora invadida, pois ficava afastada, mas ela sabia que não seria assim para sempre. Sentia que algo se aproximava.
Após seu pai sair, largou a cesta de maçãs e foi até um pé de orvalho alto, bem escondido. Lá estava Gael, ele segurava uma cesta cheia e pesada. Os dois se beijaram lentamente. Depois, sentaram-se e passaram a conversar.
— Trouxe algumas coisas para vocês. — Gael abriu a cesta. Lá dentro estavam pedaços de ferro envolvidos em um pano, legumes e um pouco de ouro. Ele costumava trazer certos alimentos para Jade e seus pais, os únicos que sabiam do relacionamento dos dois, pois aprovavam a união dos povos, embora ficassem receosos.
Jade sorriu e tirou algo de trás de sua blusa, escondido pela saia. Era um rolo de papel escrito com coordenadas.
— Siga isto no seu território e encontrará algumas árvores boas. Me disse que estava precisando de madeira. — Ele sorriu.
— Tem tido mais sonhos, meu amor? — Gael guardou o papel no bolso.
— Não são apenas sonhos mais. — Ela baixou os olhos. — Consigo ver a qualquer hora do dia, o que quer dizer que sou valiosa para seu povo. — Jade apertou o rosto de Gael com as duas mãos. — Por outro lado, nada nunca faltará para nós. — Então se beijaram novamente, até que Gael se afastou.
— Meu pai quer falar comigo hoje à noite. Ele está planejando uma nova invasão. Está saindo do controle, em breve ele atacará vocês até o fim.
Gael era filho de Tenor, o líder da aldeia D’ouro. Seu pai não o tratava com compaixão, via em Gael alguém fraco e sensível, sem aptidões para a luta, algo inadmissível.
— Nosso líder também está preparando. A próxima rebelião será devastadora, meu amor. Você precisa se proteger.
— Vocês também, minha querida.
No dia seguinte, Jade se encontraria novamente com Gael, no mesmo lugar. Por isso, ajeitou seus cabelos cacheados, limpou seu vestido e caminhou alegre até o orvalho. Novamente, lá já estava Gael, mas desta vez havia algo de errado. Ele estava jogado no chão, recaído sobre o tronco. Ao chegar perto, Jade viu como estava pálido, com vários hematomas pelo corpo. Ela o aninhou em seu colo e acariciou seu rosto, já sabia o que ocorrera.
— Meu pai quer que eu participe da próxima invasão. — Ele disse um pouco rouco. Apertou a mão de Jade. — Mas neguei, nunca poderia entrar em uma guerra, principalmente se for para ferir você ou seu povo.
— Percebo que ele não aprovou sua decisão. — Ela falava com delicadeza.
— Como sempre. Ele não aceita que eu não faça parte disso, não entende que nem todos têm o desejo da guerra.
Tenor, pai de Gael e líder do povo D’ouro, exigia que seu único filho se tornasse seu seguidor, tentava convencê-lo de que a aldeia vizinha era uma inimiga e que se eles não atacassem, seriam atacados. Gostava da guerra, sentia desejo pelo combate. Porém, Gael não era assim. Embora tenha se tornado um garoto alto e forte, suas aptidões estavam ligadas à arte, algo que Tenor abominava. Gael não gostava de brigas, guerras, foices e violência, e sim admirava o belo da vida. Queria utilizar da natureza e criar artesanatos antes nunca vistos. Sonhava em sair da aldeia e explorar os territórios, levando suas invenções artísticas pelo mundo. Era um homem delicado. E para completar, era a favor da união dos povos.
Jade se compadecia fortemente por seu amado. Ela também partilhava a vontade de partir, mas não tinha habilidades artísticas como Gael. Pelo contrário, enquanto seu namorado era delicado e sensível, ela gostava de criar foices, espadas e ferramentas. Talvez por conta da influência de Alberto. Jade era corajosa e destemida. Participou de algumas expedições com seu pai para encontrar ferro e gostava do trabalho manual. Tinha um certo tom de delicadeza, é claro, mas enquanto ela era a Lua, misteriosa e envolta em misticismo, Gael era o Sol, radiante e habilidoso.
— Não se deixe influenciar por seu pai, meu amor. — O tom de Jade era firme. — Seja fiel a si mesmo, eu posso proteger minha casa e minha família, não se preocupe.
Gael se sentou em um pulo.
— Não pense em participar das rebeliões, Jade.
— Claro que não. — Ela balançou a cabeça. — Mas vou me defender se precisar. Não sou a favor delas, mas não ficarei calada enquanto destroem meu povo. Gael não gostou da determinação em sua voz.
— Agora deite aí. — Jade o ajudou a se recostar e aproveitou para mudar de assunto. — Vou buscar algumas ervas para ajudar nos machucados.
Gael estava certo. Tenor arquitetou mais uma invasão à aldeia Oliveira D’água, atacando durante a noite o centro do território, onde uma feira acontecia. Foi uma das piores invasões, com muitas perdas de ambas as partes. O povo Oliveira já estava preparado devido aos avisos de Jade, então conseguiu conter o ataque, mas ainda assim sofreu baixas. A pior delas foi sua mãe.
A mãe de Jade participava da feira vendendo alguns caldos e receitas próprias. Sua filha pediu que não fosse, mas ela não lhe deu ouvidos. Quando o ataque começou, não teve tempo de fugir, estava na linha de frente, próxima ao caminho que o povo D’ouro realizou sorrateiramente. Foi uma das primeiras vítimas. A situação alarmou a família. Alberto ficou furioso e deixou-se ser corrompido pelo ódio e vingança. Jurou participar da próxima invasão e culpou a todos. Passou noites esculpindo armas, preparando seus ataques e golpes. Jade, por outro lado, ficou despedaçada, mas não culpava a todos como seu pai. Não desejava vingança, sabia que sua mãe não aprovaria. Desejava paz, o fim da briga. Queria propor um acordo ao seu sogro, embora ele não soubesse quem ela era. Não permitiria, em nenhuma hipótese, que seu pai participasse das brigas.
Sendo assim, ela esperou até a próxima rebelião. Sabia que seu povo iria contra-atacar. Durante dois dias permaneceu em sua casa, cuidando de seu pai e fugindo dos encontros com Gael. No terceiro, sentia-se destruída demais. Dessa vez ela chegou primeiro no orvalho, Gael apareceu logo depois, preocupado com seu sumiço. Ela desabou em seus braços e contou-lhe o ocorrido. Gael, por não ter participado da invasão, não sabia de sua mãe. Sentiu-se impotente, desejava enfrentar seu pai e acabar com a guerra. Apertou Jade fortemente e não a soltou até que os espasmos passassem. Jade não o contou sobre seu plano.
Na semana seguinte, a calmaria entre os dois povos assustava, assim como o silêncio que precede a tempestade. O povo Oliveira se preparava para invadir com toda sua força naquela noite, alegando ser o ataque decisório. Jade ouviu tudo afastada; não desejava participar da guerra, apenas usá-la. Alberto se recusava a dormir e comer direito, mas separava suas ferramentas e colocava sua roupa mais robusta. Porém, algo também acontecia na aldeia vizinha. Tenor convocou todos para uma nova invasão. A sorte ou talvez azar do povo, era que o ataque não ocorreria naquela noite; estavam decididos a atacar no dia seguinte. Separaram suas foices e enxadas, protegeram suas casas e mulheres. Isso deu a Gael a chance de fugir e contar a Jade. Então, sorrateiramente ele saiu de casa e atravessou a fronteira, sem saber que a aldeia vizinha começava a se mover, incluindo Jade, que os seguia à espreita.
Jade sabia que seu pai não a perdoaria, mas fora obrigada. Pediu que ele a ajudasse no quarto e o trancou a sete chaves. Ele esbravejou, tentou quebrar a porta e pular a janela, mas sua filha fora mais esperta e trancara tudo. Alberto ficou preso.
— Sei que está com raiva, mas não posso perdê-lo também. Vou em busca de paz, não se preocupe. — Foram suas últimas palavras antes de correr até a aldeia vizinha.
O ataque não demorou para acontecer. O povo D’ouro foi pego de surpresa, mas devido às preparações de Tenor, se defenderam prontamente. Aquela era a mais assustadora e violenta invasão de todas. O combate tomou proporções avassaladoras. A aldeia D’ouro chegou a ser incendiada em algumas partes, Tenor tomou a linha de frente junto com seus homens e lutou bravamente. Ao mesmo tempo, Gael correu pelas árvores e chegou até a casa de Jade. Encontrou Alberto aos berros. Ajudou seu sogro a sair; os dois juntos conseguiram derrubar a porta.
— Onde está Jade?
— Ela foi com a rebelião. Me prendeu aqui e foi sozinha. — Agarrou as roupas de Gael em súplica. — Vá atrás dela, meu filho. Ela não pode participar disso!
Gael sentiu seu corpo inteiro tremer. Imaginou Jade sozinha, lutando contra os homens de seu pai. Rodou pelo cômodo, catou uma foice afiado que Alberto fez e saiu em disparada até sua aldeia. Não permitiria que nada acontecesse com ela. Enfrentaria quem fosse, até seu pai.
Jade, com certeza, não estava preparada para uma rebelião. Tinha em suas mãos uma enxada, mas não sabia usá-la e nem queria. Ela se esgueirou como pode para fugir do combate, se escondendo e rastejando em meios aos gritos de desespero. Havia visto Tenor de longe uma vez e utilizou de sua vaga lembrança para procurá-lo. Era óbvio que ele estaria muito bem protegido, além de armado. Viu que ele correu até uma praça e o seguiu. Ela gritou seu nome, chamando sua atenção. Se aproximou após ele dar um golpe em um homem parecido com seu pai; congelou, imaginando ali Alberto. Dois segundos foram suficientes para que algo rígido batesse na sua cabeça por trás; um dos homens que protegia Tenor a avistou. Ela se virou, ainda no chão, e ergueu a enxada, mas não foi preciso, um de seu povo entrou em briga com o homem e o tirou dali. Jade levantou com a visão turva e gritou por Tenor novamente. Enquanto ele vinha em sua direção, ela jogou a enxada no chão e levantou as mãos.
— Venho propor um acordo! — Ela berrou, assustada com o olhar daquele homem. Agora entendia o receio de Gael. — Venho em paz!
Tenor parou por um segundo, surpreso.
— Como é, menina?
— Não queremos mais guerra. — Ela se lembrou dos momentos com Gael, de como desejava ter paz para amá-lo em toda sua proporção. — Vamos entrar em um acordo, eu faço um acordo com você. Posso ser a representante.
O líder do povo Oliveira havia sido morto pouco antes; Jade vira o momento em que ele foi golpeado. Não havia ninguém para representá-los. Tenor riu da cara dela e olhou em volta. A invasão à aldeia D’ouro estava mais uma vez contida, os poucos Oliveiras que sobreviveram estavam ajoelhados, ensanguentados e quietos. Aos poucos, todos foram prestando atenção na conversa. Jade passou a falar alto.
— Peço clemência pelo meu povo.
Tenor era irredutível. Não acreditava na união e sentia um profundo desgosto pelo povo vizinho. Já tinha sido corrompido pelo o que há de pior. Ele golpeou Jade com força, a pegando de surpresa. A pancada que levara na cabeça minutos antes não ajudara e ela caiu desacordada no chão; sangue escorria de sua testa. O líder do povo D’ouro viu que as pessoas em volta não aprovaram, alguns o xingaram e outros apenas suspiraram. Tenor, então, resolveu mostrar que não havia acordo a ser feito. Levantou sua foice e desceu sua mão em direção ao coração de Jade, mas foi impedido por um golpe que levou na costela, perfurando a pele, caiu desajeitado no chão. Seu filho Gael o golpeara. Ele se ajoelhou ao lado de Jade; ódio envolvia seu olhar. Tenor se levantou gemendo.
— O que acha que está fazendo, seu idiota?
— Desejava tanto que eu fosse seu herdeiro, bom estou aqui para cumprir seu desejo. — Gael segurou sua foice com firmeza e aumentou a voz. — Desista da invasão, aceite fazer um acordo e eu não tomarei a sua aldeia de você.
Tenor gargalhou.
— Você não teria coragem. Me disse várias vezes que nunca participaria da guerra!
Por Jade sim. Por ela, Gael entraria em qualquer combate. Seu sangue ferveu. Odiava seu pai, odiava o que ele tinha feito à Jade. Levantou-se em um pulo e se jogou. Tenor tentou se defender, mas Gael era rápido e preciso, estava sendo movido por algo que Tenor jamais sentira: amor. Quando seu pai tentou golpeá-lo, Gael se esquivou e o perfurou no coração, de uma só vez. Tenor caiu como uma pedra.
— A partir de agora, eu decido o que vai acontecer. — Gael brandou o mais alto que pode. — E eu digo que esta guerra está terminada.
A verdade é que todos estavam cansados da guerra e ninguém iria se opor ao novo líder; os poucos que tinham a mesma mentalidade foram contidos pelo próprio povo. Os aldeões Oliveira foram soltos para enviar a mensagem de paz. Gael ergueu Jade e a levou até sua casa, ignorando o pai que jazia no chão. O ataque havia acabado, restava agora apenas juntar os cacos da destruição e construir um novo império sobre eles.
Gael assumiu a aldeia D’ouro e Jade a aldeia Oliveira D’água, mas decidiram que seria apenas temporário, pois ambos desejavam partir em direção ao mundo. O tratado foi aceito por ambas as partes e as aldeias tornaram-se uma só cidade, adotando a democracia. O casal ficou por mais alguns anos até partirem dali. O pai de Jade se foi um pouco depois do fim da guerra, acreditam que morreu de amor. Gael e Jade seguiram rumo ao mundo, explorando o que havia de mais belo fora de suas aldeias. Mas prometeram voltar; um dia retornariam às suas terras, onde era seu verdadeiro lar.
Em uma época onde a tecnologia não existia, as cidades ainda estavam em desenvolvimento e as maiores invenções humanas eram uma novidade, um grupo, consideravelmente grande, andou por quilômetros e mais quilômetros em busca de um lugar melhor para morar. Vagou pelas estradas de terra, pela rodovia, pela floresta e até pelas montanhas. Eram cidadãos que queriam sair da cidade principal em busca de independência própria. Esse grupo firmou os pedaços de maneira e amarrou as primeiras barracas em um solo ainda não remexido pela ação humana. Não havia dono ainda. Dessa atitude, fundaram-se duas espécies de aldeias que almejavam se tornarem grandes cidades. Os líderes do grupo dividiram-se e cada um ocupou uma parte do terreno. Dessa divisão surgiram as aldeias D’ouro e a Oliveira D’água, pequeninas e humildes, ali pelas beiras do Espírito Santo.
A aldeia D’ouro ficava mais próxima ao chamado Rio Doce, o maior e mais límpido da região que os moradores puderam encontrar, suas margens tinham solo fértil para a plantação de diversos alimentos. Além disso, era desse lado do território que se encontrava uma grande quantidade de ferro e ouro, material usado para fazer as ferramentas usadas nas plantações. Naquele tempo, os aldeões ainda não tinham muito conhecimento do valor do ouro, então ele não era visto como matéria preciosa, era só um material para fundir e criar picaretas e enxadas. O que importava mesmo eram os alimentos: os legumes, as frutas e as verduras que cresciam do solo e podiam matar a fome – ouro não tinha esse poder. E isso, por outro lado, era algo escasso na aldeia Oliveira D’água. Essa tinha muitas árvores frutíferas e pouco solo fértil para plantações deste tipo, comparado ao da aldeia vizinha; as árvores, entretanto, eram mais altas, davam mais sombra e podiam ser usadas para a criação de móveis. A Oliveira D’água ficava mais afastada do Rio Doce, mas seus pequenos riachos estavam repletos de peixes saborosos, diferente do rio vizinho, que tinha peixes de carne dura. Sendo assim, após se firmarem no solo, os “líderes” de cada aldeia entraram em um acordo de união: dividiriam tudo. Mas como o egoísmo e ambição são sentimentos entranhados no ser humano, este acordo não permaneceu para sempre. Houve desentendimento, abuso e briga de poder, no final, cada um foi para o seu lado, tendo que sobreviver com o que tinha, e a ideia de uma união foi por água abaixo. Dez anos depois, o clima havia piorado ainda mais; aconteceram episódios de roubos, pequenas invasões e brigas entre seus povos. Assim criaram uma barreira com portões e cercas de madeira para delimitar o território; adotaram a ideia de fronteira. A aldeia D’ouro desejava as árvores e os peixes saborosos do lado vizinho; a Oliveira D’água desejava o solo fértil e os minérios por lá encontrados. Mas nenhum líder daria o braço a torcer, eram homens carrancudos e orgulhosos, era mais fácil tomar à força do que fortalecer a ideia de convergência.
Quem sofria com isso eram os aldeões; alguns eram influenciados pela mente do líder, já outros desejavam a união e tinha aqueles que só queriam ser livres para amar. Era o caso de Jade e Gael. Ambos vieram bebês com os primeiros povos e cresceram juntos. Eles tinham apenas dez anos quando a primeira briga veio à tona – a separação definitiva. Eram unha e carne, brincavam juntos, dançavam juntos e, mesmo na inocência da infância, se apaixonaram juntos. Após a separação, foram obrigados a conviver às escondidas, entre pulos de cerca e esconderijos secretos. Isso por que Jade pertencia ao povo Oliveira, e Gael, ao D’ouro. Em nenhum momento um desistiu do outro, pelo contrário, a paixão só aumentou. Entretanto, nada poderia seguir tão bem para sempre – quando os dez anos da separação definitiva se passaram, uma nova briga, muito pior, espreitava pelos cantos.
— Sabe que não precisa ir sozinho, pai. — Jade protestou, segurando uma cesta repleta de maçãs. Estavam nos fundos de sua casa, o quintal era basicamente a floresta densa que ficava atrás. Seu pai, Alberto, se preparava para mais uma expedição. — Posso ajudá-lo.
— Você já ajuda, minha filha. — Ele ergueu um pedaço de papel com instruções. — Basta seguir o caminho e encontrarei o ferro.
— E se perder o papel? Não seria melhor que eu fosse junto?
Alberto bufou, mas não respondeu. Se despediu da filha, pegou sua bolsa e desapareceu por entre as árvores.
— Deixe-o, Jade. Sabe como é teimoso. — Sua mãe surgiu da porta da cozinha. O cheiro de frango assado preenchia o ar. — E ele tem razão, você já o ajudou bastante, fique aqui onde é mais seguro.
Após a separação dos povos, cada aldeia precisou sobreviver em meio a certas dificuldades, entretanto, um fator de extrema importância viria a aparecer em breve. Ao longo do tempo, os aldeões da Oliveira D’água passaram a notar que suas mulheres, em especial as meninas que nasceram e cresceram sobre aquela terra, eram especiais. Logo depois veio a confirmação: eram mulheres mágicas. As crianças conseguiam prever catástrofes, saber o dia de chuva, o dia de Sol forte e até quando algum agouro iria contaminar as casas. Jaqueline, da família Souza, previu que seu irmão iria ser contaminado com uma doença desconhecida e deixou claro que caso alguém entrasse em contato com ele, sofreria junto. Todos ficaram assustados, menos o pai, que cismou em contrariar a filha. O resultado: pai e filho não resistiram. O filho piorou, e o pai foi contaminado ao ficar no mesmo quarto. Até o enterro foi difícil, os aldeões precisaram seguir à risca as ordens da filha para que ninguém mais fosse junto. Depois do acontecido, houve uma comoção geral que chegou aos ouvidos do povo vizinho; o líder testou as suas mulheres também, porém não adiantou. Apenas as mulheres da Oliveira D’água tinham o dom. Logo foi considerado solo sagrado, e as meninas que cresciam tornaram-se dádivas dos céus, sendo protegidas da inveja da aldeia vizinha.
Jade não era diferente; seu pai era soldador e penava para encontrar matéria-prima, ela então ouvia a natureza, sentia o pulsar do solo e conseguia ver onde havia minério. Passou a dar as coordenadas ao seu pai, assim como também sentia uma vibração maior de um lado do pequeno riacho que banhava a aldeia – era lá que os peixes se escondiam. Seu dom despertou com 16 anos, quatro anos antes daquele dia, e desde então ela precisou se proteger das invasões que começavam a ocorrer. O clima entre as aldeias havia piorado já nesta época, o líder D’ouro decidiu declarar guerra e constantemente invadia o terreno vizinho querendo conquistar não só suas riquezas, como também seu povo. Queria as mulheres mágicas. Elas previam as tempestades naturais, o que significada se precaver e evitar perdas, e sabiam ouvir a natureza, o que ajudava na caça e pesca. O povo da Oliveira D’água conseguia conter as invasões e, em contrapartida, também planejavam investir contra o inimigo. Uma guerra estava claramente declarada, uma bomba relógio prestes a explodir. A casa de Jade não fora invadida, pois ficava afastada, mas ela sabia que não seria assim para sempre. Sentia que algo se aproximava.
Após seu pai sair, largou a cesta de maçãs e foi até um pé de orvalho alto, bem escondido. Lá estava Gael, ele segurava uma cesta cheia e pesada. Os dois se beijaram lentamente. Depois, sentaram-se e passaram a conversar.
— Trouxe algumas coisas para vocês. — Gael abriu a cesta. Lá dentro estavam pedaços de ferro envolvidos em um pano, legumes e um pouco de ouro. Ele costumava trazer certos alimentos para Jade e seus pais, os únicos que sabiam do relacionamento dos dois, pois aprovavam a união dos povos, embora ficassem receosos.
Jade sorriu e tirou algo de trás de sua blusa, escondido pela saia. Era um rolo de papel escrito com coordenadas.
— Siga isto no seu território e encontrará algumas árvores boas. Me disse que estava precisando de madeira. — Ele sorriu.
— Tem tido mais sonhos, meu amor? — Gael guardou o papel no bolso.
— Não são apenas sonhos mais. — Ela baixou os olhos. — Consigo ver a qualquer hora do dia, o que quer dizer que sou valiosa para seu povo. — Jade apertou o rosto de Gael com as duas mãos. — Por outro lado, nada nunca faltará para nós. — Então se beijaram novamente, até que Gael se afastou.
— Meu pai quer falar comigo hoje à noite. Ele está planejando uma nova invasão. Está saindo do controle, em breve ele atacará vocês até o fim.
Gael era filho de Tenor, o líder da aldeia D’ouro. Seu pai não o tratava com compaixão, via em Gael alguém fraco e sensível, sem aptidões para a luta, algo inadmissível.
— Nosso líder também está preparando. A próxima rebelião será devastadora, meu amor. Você precisa se proteger.
— Vocês também, minha querida.
No dia seguinte, Jade se encontraria novamente com Gael, no mesmo lugar. Por isso, ajeitou seus cabelos cacheados, limpou seu vestido e caminhou alegre até o orvalho. Novamente, lá já estava Gael, mas desta vez havia algo de errado. Ele estava jogado no chão, recaído sobre o tronco. Ao chegar perto, Jade viu como estava pálido, com vários hematomas pelo corpo. Ela o aninhou em seu colo e acariciou seu rosto, já sabia o que ocorrera.
— Meu pai quer que eu participe da próxima invasão. — Ele disse um pouco rouco. Apertou a mão de Jade. — Mas neguei, nunca poderia entrar em uma guerra, principalmente se for para ferir você ou seu povo.
— Percebo que ele não aprovou sua decisão. — Ela falava com delicadeza.
— Como sempre. Ele não aceita que eu não faça parte disso, não entende que nem todos têm o desejo da guerra.
Tenor, pai de Gael e líder do povo D’ouro, exigia que seu único filho se tornasse seu seguidor, tentava convencê-lo de que a aldeia vizinha era uma inimiga e que se eles não atacassem, seriam atacados. Gostava da guerra, sentia desejo pelo combate. Porém, Gael não era assim. Embora tenha se tornado um garoto alto e forte, suas aptidões estavam ligadas à arte, algo que Tenor abominava. Gael não gostava de brigas, guerras, foices e violência, e sim admirava o belo da vida. Queria utilizar da natureza e criar artesanatos antes nunca vistos. Sonhava em sair da aldeia e explorar os territórios, levando suas invenções artísticas pelo mundo. Era um homem delicado. E para completar, era a favor da união dos povos.
Jade se compadecia fortemente por seu amado. Ela também partilhava a vontade de partir, mas não tinha habilidades artísticas como Gael. Pelo contrário, enquanto seu namorado era delicado e sensível, ela gostava de criar foices, espadas e ferramentas. Talvez por conta da influência de Alberto. Jade era corajosa e destemida. Participou de algumas expedições com seu pai para encontrar ferro e gostava do trabalho manual. Tinha um certo tom de delicadeza, é claro, mas enquanto ela era a Lua, misteriosa e envolta em misticismo, Gael era o Sol, radiante e habilidoso.
— Não se deixe influenciar por seu pai, meu amor. — O tom de Jade era firme. — Seja fiel a si mesmo, eu posso proteger minha casa e minha família, não se preocupe.
Gael se sentou em um pulo.
— Não pense em participar das rebeliões, Jade.
— Claro que não. — Ela balançou a cabeça. — Mas vou me defender se precisar. Não sou a favor delas, mas não ficarei calada enquanto destroem meu povo.
Gael não gostou da determinação em sua voz.
— Agora deite aí. — Jade o ajudou a se recostar e aproveitou para mudar de assunto. — Vou buscar algumas ervas para ajudar nos machucados.
Gael estava certo. Tenor arquitetou mais uma invasão à aldeia Oliveira D’água, atacando durante a noite o centro do território, onde uma feira acontecia. Foi uma das piores invasões, com muitas perdas de ambas as partes. O povo Oliveira já estava preparado devido aos avisos de Jade, então conseguiu conter o ataque, mas ainda assim sofreu baixas. A pior delas foi sua mãe.
A mãe de Jade participava da feira vendendo alguns caldos e receitas próprias. Sua filha pediu que não fosse, mas ela não lhe deu ouvidos. Quando o ataque começou, não teve tempo de fugir, estava na linha de frente, próxima ao caminho que o povo D’ouro realizou sorrateiramente. Foi uma das primeiras vítimas. A situação alarmou a família. Alberto ficou furioso e deixou-se ser corrompido pelo ódio e vingança. Jurou participar da próxima invasão e culpou a todos. Passou noites esculpindo armas, preparando seus ataques e golpes. Jade, por outro lado, ficou despedaçada, mas não culpava a todos como seu pai. Não desejava vingança, sabia que sua mãe não aprovaria. Desejava paz, o fim da briga. Queria propor um acordo ao seu sogro, embora ele não soubesse quem ela era. Não permitiria, em nenhuma hipótese, que seu pai participasse das brigas.
Sendo assim, ela esperou até a próxima rebelião. Sabia que seu povo iria contra-atacar. Durante dois dias permaneceu em sua casa, cuidando de seu pai e fugindo dos encontros com Gael. No terceiro, sentia-se destruída demais. Dessa vez ela chegou primeiro no orvalho, Gael apareceu logo depois, preocupado com seu sumiço. Ela desabou em seus braços e contou-lhe o ocorrido. Gael, por não ter participado da invasão, não sabia de sua mãe. Sentiu-se impotente, desejava enfrentar seu pai e acabar com a guerra. Apertou Jade fortemente e não a soltou até que os espasmos passassem. Jade não o contou sobre seu plano.
Na semana seguinte, a calmaria entre os dois povos assustava, assim como o silêncio que precede a tempestade. O povo Oliveira se preparava para invadir com toda sua força naquela noite, alegando ser o ataque decisório. Jade ouviu tudo afastada; não desejava participar da guerra, apenas usá-la. Alberto se recusava a dormir e comer direito, mas separava suas ferramentas e colocava sua roupa mais robusta. Porém, algo também acontecia na aldeia vizinha. Tenor convocou todos para uma nova invasão. A sorte ou talvez azar do povo, era que o ataque não ocorreria naquela noite; estavam decididos a atacar no dia seguinte. Separaram suas foices e enxadas, protegeram suas casas e mulheres. Isso deu a Gael a chance de fugir e contar a Jade. Então, sorrateiramente ele saiu de casa e atravessou a fronteira, sem saber que a aldeia vizinha começava a se mover, incluindo Jade, que os seguia à espreita.
Jade sabia que seu pai não a perdoaria, mas fora obrigada. Pediu que ele a ajudasse no quarto e o trancou a sete chaves. Ele esbravejou, tentou quebrar a porta e pular a janela, mas sua filha fora mais esperta e trancara tudo. Alberto ficou preso.
— Sei que está com raiva, mas não posso perdê-lo também. Vou em busca de paz, não se preocupe. — Foram suas últimas palavras antes de correr até a aldeia vizinha.
O ataque não demorou para acontecer. O povo D’ouro foi pego de surpresa, mas devido às preparações de Tenor, se defenderam prontamente. Aquela era a mais assustadora e violenta invasão de todas. O combate tomou proporções avassaladoras. A aldeia D’ouro chegou a ser incendiada em algumas partes, Tenor tomou a linha de frente junto com seus homens e lutou bravamente. Ao mesmo tempo, Gael correu pelas árvores e chegou até a casa de Jade. Encontrou Alberto aos berros. Ajudou seu sogro a sair; os dois juntos conseguiram derrubar a porta.
— Onde está Jade?
— Ela foi com a rebelião. Me prendeu aqui e foi sozinha. — Agarrou as roupas de Gael em súplica. — Vá atrás dela, meu filho. Ela não pode participar disso!
Gael sentiu seu corpo inteiro tremer. Imaginou Jade sozinha, lutando contra os homens de seu pai. Rodou pelo cômodo, catou uma foice afiado que Alberto fez e saiu em disparada até sua aldeia. Não permitiria que nada acontecesse com ela. Enfrentaria quem fosse, até seu pai.
Jade, com certeza, não estava preparada para uma rebelião. Tinha em suas mãos uma enxada, mas não sabia usá-la e nem queria. Ela se esgueirou como pode para fugir do combate, se escondendo e rastejando em meios aos gritos de desespero. Havia visto Tenor de longe uma vez e utilizou de sua vaga lembrança para procurá-lo. Era óbvio que ele estaria muito bem protegido, além de armado. Viu que ele correu até uma praça e o seguiu. Ela gritou seu nome, chamando sua atenção. Se aproximou após ele dar um golpe em um homem parecido com seu pai; congelou, imaginando ali Alberto. Dois segundos foram suficientes para que algo rígido batesse na sua cabeça por trás; um dos homens que protegia Tenor a avistou. Ela se virou, ainda no chão, e ergueu a enxada, mas não foi preciso, um de seu povo entrou em briga com o homem e o tirou dali. Jade levantou com a visão turva e gritou por Tenor novamente. Enquanto ele vinha em sua direção, ela jogou a enxada no chão e levantou as mãos.
— Venho propor um acordo! — Ela berrou, assustada com o olhar daquele homem. Agora entendia o receio de Gael. — Venho em paz!
Tenor parou por um segundo, surpreso.
— Como é, menina?
— Não queremos mais guerra. — Ela se lembrou dos momentos com Gael, de como desejava ter paz para amá-lo em toda sua proporção. — Vamos entrar em um acordo, eu faço um acordo com você. Posso ser a representante.
O líder do povo Oliveira havia sido morto pouco antes; Jade vira o momento em que ele foi golpeado. Não havia ninguém para representá-los. Tenor riu da cara dela e olhou em volta. A invasão à aldeia D’ouro estava mais uma vez contida, os poucos Oliveiras que sobreviveram estavam ajoelhados, ensanguentados e quietos. Aos poucos, todos foram prestando atenção na conversa. Jade passou a falar alto.
— Peço clemência pelo meu povo.
Tenor era irredutível. Não acreditava na união e sentia um profundo desgosto pelo povo vizinho. Já tinha sido corrompido pelo o que há de pior. Ele golpeou Jade com força, a pegando de surpresa. A pancada que levara na cabeça minutos antes não ajudara e ela caiu desacordada no chão; sangue escorria de sua testa. O líder do povo D’ouro viu que as pessoas em volta não aprovaram, alguns o xingaram e outros apenas suspiraram. Tenor, então, resolveu mostrar que não havia acordo a ser feito. Levantou sua foice e desceu sua mão em direção ao coração de Jade, mas foi impedido por um golpe que levou na costela, perfurando a pele, caiu desajeitado no chão. Seu filho Gael o golpeara. Ele se ajoelhou ao lado de Jade; ódio envolvia seu olhar. Tenor se levantou gemendo.
— O que acha que está fazendo, seu idiota?
— Desejava tanto que eu fosse seu herdeiro, bom estou aqui para cumprir seu desejo. — Gael segurou sua foice com firmeza e aumentou a voz. — Desista da invasão, aceite fazer um acordo e eu não tomarei a sua aldeia de você.
Tenor gargalhou.
— Você não teria coragem. Me disse várias vezes que nunca participaria da guerra!
Por Jade sim. Por ela, Gael entraria em qualquer combate. Seu sangue ferveu. Odiava seu pai, odiava o que ele tinha feito à Jade. Levantou-se em um pulo e se jogou. Tenor tentou se defender, mas Gael era rápido e preciso, estava sendo movido por algo que Tenor jamais sentira: amor. Quando seu pai tentou golpeá-lo, Gael se esquivou e o perfurou no coração, de uma só vez. Tenor caiu como uma pedra.
— A partir de agora, eu decido o que vai acontecer. — Gael brandou o mais alto que pode. — E eu digo que esta guerra está terminada.
A verdade é que todos estavam cansados da guerra e ninguém iria se opor ao novo líder; os poucos que tinham a mesma mentalidade foram contidos pelo próprio povo. Os aldeões Oliveira foram soltos para enviar a mensagem de paz. Gael ergueu Jade e a levou até sua casa, ignorando o pai que jazia no chão. O ataque havia acabado, restava agora apenas juntar os cacos da destruição e construir um novo império sobre eles.
Gael assumiu a aldeia D’ouro e Jade a aldeia Oliveira D’água, mas decidiram que seria apenas temporário, pois ambos desejavam partir em direção ao mundo. O tratado foi aceito por ambas as partes e as aldeias tornaram-se uma só cidade, adotando a democracia. O casal ficou por mais alguns anos até partirem dali. O pai de Jade se foi um pouco depois do fim da guerra, acreditam que morreu de amor. Gael e Jade seguiram rumo ao mundo, explorando o que havia de mais belo fora de suas aldeias. Mas prometeram voltar; um dia retornariam às suas terras, onde era seu verdadeiro lar.
Conto escrito por
Charlotte Thomas
Tema
I'll Always Be By Your Side
Intérprete
Lamaris
CAL - Comissão de Autores Literários
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I'll Always Be By Your Side
Intérprete
Lamaris
CAL - Comissão de Autores Literários
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Telma Marya
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Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
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