2x01 - Sofia seria Sereia
de Pedro Linhares
A casa estava vazia, mas seu pai voltaria logo. A criança não deveria ser deixada sozinha, mas era uma emergência e não havia nenhuma babá disponível, e a avó estava viajando. A vizinha ficara encarregada de cuidar da menina, mas achou que seria mais interessante dar-lhe privacidade durante o banho.
Dona Ofélia estava na sala de estar, assistindo a um programa qualquer. Sofia estava dentro da banheira. Dona Ofélia dormiu. Sofia já tinha seus dedos enrugados.
Sabia o que fazer, não era problema nenhum, dada sua idade e habilidades motoras, mas gostava de ficar mergulhada na água quente. Os dedos enrugados eram engraçados. Por que ficavam assim? A água os deixava estranhos? Poderia estar se transformando em alguma outra coisa? Viraria um peixe, se ficasse tempo demais dentro da água? Seria um peixe muito estranho? Talvez virasse uma carpa? Ou então um bagre? Deveria testar?
— Por que não? — perguntou-se, olhando para os frascos de xampu e condicionador.
Trinta minutos se passaram, e nada. Uma hora, e nada. Talvez nadar dentro da banheira não fosse a melhor maneira de fazer algo acontecer.
Mas então, quase três horas depois, com a pele dos dedos muito enrugada, Sofia sentiu algo estranho em suas pernas: elas pareciam coladas uma na outra, como se nunca tivessem sido separadas antes. Estava acontecendo. Será que viraria um peixe colorido bem bonito? Ou então um listrado em preto e branco?
Sofia levou mais alguns minutos e já não tinha dedos do pé. Não sentia nada em seus ossos, como se eles nem se movessem. Com as pernas unidas, o lugar onde antes havia pés começou a arquear, abrindo-se para fora como uma cauda de baleia. Sua pele ficou mais dura, e divisões em forma de losango apareceram, pouco a pouco. Não houve mudança de cor, mas a textura lembrava a de um peixe. Uma coceira leve nos lados do pescoço, revelou as guelras.
Sofia se transformara em uma sereia.
Estava tão feliz! Sua risada acordaria Dona Ofélia? Talvez. Será que conseguia respirar debaixo da água? O ar não parecia lhe fazer mal algum, mas valia o teste. Sofia mergulhou a cabeça. A água entrou em seus pulmões e saiu tranquilamente, como se respirasse ar de verdade! Era uma sereia agora, poderia nadar no mar e ir para qualquer lugar! Fazer amizade com os peixes, baleias e golfinhos e…
— Oh, querida — disse Dona Ofélia, cutucando-a, despertando-a de seu sono. A senhora tinha um sorriso no rosto. — Você não pode dormir na banheira, é muito perigoso, querida. Venha, vamos secá-la agora mesmo.
Sofia bocejou e moveu seus dedos do pé. Foi um sonho… Que chato.
CAL - Comissão de Autores Literários
Produção
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
REALIZAÇÃO
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