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Flor-de-Cera: Capítulo 30

Novela de Carlos Mota
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FLOR-DE-CERA - CAPÍTULO 30


– Vamos ver! Ela regressou ao C.T.I.

– E vai se salvar? – indaga, demonstrando uma inquietação incomum.

– Ela é forte! Os Arraias são fortes.

– Arraia? Não seria uma Dumont? – questiona-se Alberto.

– Ondi nóis tá? O avião vai caí!

– Calma, dona Josefa! Ainda não decolamos – diz o delegado Chico Santinho, o companheiro de viagem da mãe de Joaquim.

– Misericórdia! I isso ié siguro? – faz o sinal da cruz duas ou três vezes, com a santinha em mãos.

– Sim! Muito!

– Mais ieu ouvu muitu fala que essi trem vivi cainu.

– Exagero, dona Josefa! Aperte o cinto, o avião está decolando.

– Ai, ai, meu Deus, meu Deus, segura, segura, segura pião... Ahhhhhh!



Rubens passa pela recepção, sendo abordado por Ernestina, que lhe faz a seguinte pergunta:

– Doutor, o que será de Dona Catharine? Sei que a enfermidade dela é grave e, depois do que viveu há pouco, poderá não ter forças para continuar neste mundo.

– Minha boa mulher, acalme-se! Ela está lúcida, com os vômitos contidos, pelo menos é o que informaram. Fomos rápidos no socorro.

– Isso quer dizer que ela pode receber visitas?

– Ela retornou ao C.T.I. por precaução; mas, dependendo da avaliação da equipe de oncologistas, voltará para o quarto.

– Oncologistas? Ela tem o quê, doutor? Não me esconda mais nada, sabe o quanto amo aquela menina, e o que fui capaz de fazer para que fosse feliz; se ela trilhou o caminho oposto, foi porque deu mais ouvidos àquela praga de homem, que hoje, felizmente, jaz naquele manicômio, como anunciam as vozes fervorosas das rádios sensacionalistas desta cidade.

– Eu sei! George mesmo assumiu, só não fez o pior porque você estava sempre ao lado dela. Foi o seu anjo da guarda! Obrigado por ter salvado minha filha!

– Sabe, doutor, em um dos embates recentes com aquele ser dos infernos, ele teve a pachorra de dizer que de nada me serviram os conhecimentos adquiridos, porque eu só recitava frases decoradas, não passando de uma empregadazinha sem eira nem beira. Fiquei abalada com isso, confesso, mas depois percebi que eu não havia procurado coisa melhor, talvez um emprego de destaque na sociedade, porque meu maior prazer não se resumia à quantia em dinheiro que alcançaria ou ao status de um cargo no topo da pirâmide social, mas a cuidar de Dona Catharine, por quem cultivo um grande amor. Um amor que vai além do de uma empregada por sua patroa, mas o de uma mãe por sua filha. Em nome desse sentimento, desse carinho tão intenso, que não fui embora. Poderia! Mas deixaria parte de meu coração para trás.

– Ernestina... – fala ele, emocionado.

– Tadinha, tão frágil, sem pai nem mãe, diante de um ignorante daqueles, humilhada dia sim outro também, como poderia deixá-la? Ficou ainda mais difícil de partir depois que ela perdeu Alana, não consigo nem pensar, a mulher se acabou num sofrimento tão intenso... A menina era tudo para ela – lágrimas lhe escorrem pela face. – Era Alana que a fazia sorrir com seus gritinhos de manhã, seu sorriso de anjo, seu jeitinho delicado de dizer “mamãe, eu te amo!”. Meu Deus! Não imagino perder uma filha! Deve doer, aliás, deve não, dói demais! Por isso fiquei aqui! Se alçasse novos voos, teria um emprego melhor, à custa de lágrimas daquela que me ensinou a ler e escrever. Que gratidão seria essa? Meu coração pedia para que ficasse e aqui estou. Como seu George não compreendia o que significava gratidão, quis me humilhar. Coitado! Senti dó!

– George teve o fim que mereceu! Na vida, nem tudo segue o curso do rio, às vezes, somos obrigados a tomar caminhos diferentes para aprender alguma coisa; o que ele sempre se negou – diz Rubens.

– E a tal história do testamento? Isso me intriga! Será que seu Dilermando, por pior que fosse dona Franceline, seria capaz de tal monstruosidade? Tem algo nesta história que não se encaixa, como se tudo tivesse sido premeditado para um desfecho inimaginável.

– Concordo! Ainda mais que o vereador é o seu legítimo filho.

– Pois é! Condenou dona Franceline por amar o senhor, como se ela fosse o próprio diabo em forma de gente; quando, na verdade, fazia a mesma coisa, talvez pior. Também não valia nada!

– George é o verdadeiro dono de tudo!

– Pois é! O homem lutou tanto pelo poder, pela fortuna da mulher que nunca amou, para no final das contas, descobrir que tudo era dele. Só dele! Como não ficou sua cabeça monstruosa ao se deparar com essa verdadeira rasteira do destino?

– Verdade! Quanto ao testamento, não temos acesso a ele, está no cofre. E só Catharine poderá abri-lo.

– Doutor, um testamento precisa ser registrado em um cartório?

– Nem sempre! Pode ser deixado aos cuidados de um advogado ou mesmo no cofre, para que, em caso de perda, as vontades do morto sejam cumpridas.

– Ernestina, alguma coisa Dilermando está tramando, acabou de chegar aqui o doutor Jaime, aquele advogado interesseiro, lembra-se? – pergunta Franceline, vendo-o pela janela. – Aquele que anda para baixo e para cima com uma pequena maleta azul.

– Lembrei, senhora! Mas o que tanto a inquieta? Ele é o advogado da família.

– Quando este homem vem a nossa casa, coisa boa não é! É o bode expiatório do meu marido, aquele que trama as piores armadilhas jurídicas, que nem mesmo os magistrados da mais alta corte conseguem encontrar uma saída.

– Isso quer dizer o quê?

– Que alguém será o seu alvo!

– Será?

– Creio que sim, minha amiga! Dilermando anda muito mal, procura uma forma de prejudicar a todos. Espere! Só pode! Deve estar alterando o testamento...

– Mas para quê?

– Não sei! Uma pessoa ferida é capaz das maiores maldades, inclusive a de derrubar um pássaro com uma flecha.

– E quem seria o pássaro da vez?

– Já disse, não sei! Mas o estranho é que mandou chamar aquele rapazinho, o tal de Jorge, o noivo de Catharine.

– Que coisa maluca!

– Alguma coisa ruim ele está tramando, eu sinto neste coração de mãe que a terra há de devorar um dia.

Uma indisposição abate a mulher, que se segura à parede.

– Dona Franceline, o que há? Venha, sente-se, anda muito tensa.

– Não estou aguentando mais esta vida! Ter de fingir todo o tempo um casamento de faz de contas para que a plebe acredite mesmo que os Dumont sejam infalíveis. Quanta bobagem!

– A senhora tomou o remédio para o coração?

– Esqueci, querida! Pegue-o para mim!

– Esqueceu outra vez? A senhora não pode deixar de tomá-lo, sabe que...

– Ninguém parte antes da hora, querida! Acalme-se!

– E foi a única vez que ela tocou no assunto comigo – diz Ernestina a Rubens, após revelar-lhe memórias de um passado dolorido. – Meses depois da morte do traste, ela sofreu um infarto.

– Ainda me lembro! Ela estava cansada de viver, deixava de tomar o remédio de propósito.

– É... – conforma-se a empregada.

– Então, se isso tudo for verdade, doutor Jaime poderá nos ajudar – deduz Rubens.

– Não sei! Ele é liso como uma enguia. Se for de seu interesse, dirá tudo; senão, levará tudo o que tanto ansiamos para o túmulo. Como poderemos cobrá-lo de algo? Sinceramente, não sei!

– Bem, vamos subir, daremos uma palavrinha a minha filha...

– Ela não quer te ver, doutor! Lembra-se? Não que eu deseje, mas não seria melhor que fosse vê-la depois? Espere as ondas do mar se acalmarem.

– Não, Ernestina! O que resta a um pai como eu? Desprezo! Então, o que vier será lucro.

– Sua autoestima está muito baixa – surpreende-se a mulher. – Vamos, seja o que Deus quiser!

Entram no elevador. A porta se fecha.

– E o homem que Moacir atropelou? – inquire a mulher.

– Está bem! Sofreu apenas algumas escoriações.

– E o coitado do Moacir? Caiu no golpe do prefeito e está no xilindró.

– Só o Moacir para acreditar nas palavras daquele bebum. Depois veremos um jeito de ajudá-lo.

A porta se abre.

– Vamos, Ernestina!

Entram no C.T.I, caminham pelos biombos, até onde está a filha de Rubens. Acordada, quando os vê, Catharine, com os olhos injetados de cólera, ordena:

– Saia daqui, Rubens! Saia!

– Minha querida, ele é seu pai! Dê-lhe uma chance para que se explique.

– Meu pai morreu há muito tempo e se chama Dilermando Dumont.

– Deixe-me... – pede o médico.

– Cale essa boca, homem! Não percebeu, não quero ouvi-lo, não quero! Você destruiu minha vida. Quer mais o quê?

– E o que ele fez, dona Catharine? Entregou-se apenas ao amor de sua mãe. Raciocine, ele não tem culpa do que aconteceu, ninguém tem, aliás, se houver, o culpado é o homem que a senhora ainda chama de pai, porque foi ele que mexeu no testamento, aguçando a ambição daquele insano do seu George. Pare!

– Deixe, Ernestina! Deixe! Um dia ela entenderá!

– Nunca entenderei... Você... você é um patife! Conseguiu destruir o casamento de minha mãe com meu pai. Agora quer apossar-se do prêmio? Nunca! Jamais o deixarei encostar em mim e me chamar de filha.

O médico abaixa a cabeça, limpa uma lágrima, toma dois goles de ar e se retira. Ao chegar à porta, é abordado por Stela, que lhe passa os resultados dos exames de Catharine. São piores do que ele imaginava. De posse deles, procura a equipe oncológica, que, sem maiores delongas, afirma que a vida da mulher depende de um transplante de medula. O tratamento convencional começaria em breve, todavia, o êxito só seria alcançado se encontrassem um doador compatível, cujas chances, até o momento, pareciam remotas.

– Você foi injusta, dona Catharine! Esse homem sempre cuidou da senhora, antes mesmo de saber ser seu pai. Por que tratá-lo desse jeito? Mudará alguma coisa? O que está feito, feito está! Dê-lhe uma chance!

– Me deixe, Ernestina! Me deixe!

– Às vezes acho que a convivência com seu George tenha ido além do contato físico, porque, rude com as palavras, em muito se parece com ele. Uma pena!

– O que diz? Igual ao George? Nunca! Deus só errou uma vez ao fazê-lo.

– Mas os homens gostam de propagar os erros e vendê-los como a perfeição.

– Por que lhe ensinei a ler? Termina sempre por me dominar com suas palavras... – diz, percebendo ter magoado a empregada. – Me desculpe! Não quis ofendê-la. Não estou bem! Sinto que estou perto do fim e isso me angustia! Sabe o que é estar à porta de outro mundo, esperando apenas um empurrãozinho, para partir? Assim estou me sentindo... sem esperança!

Ernestina emudece, para o incômodo da dama de Vila dos Princípios, que cobra:

– Ernestina, por que se cala? Já pedi desculpas!

– Palavras, dependendo de quais sejam, significam pão. Outras, sorte ou sucesso, outras desejam a nossa morte. Mas, sem elas o mundo não tem sentido. Dão liberdade, levantam exércitos, calam nações. Por isso, ficar calado às vezes é mais prudente, não acha? Palavras de Edivanio Leite¹.

– Desculpe, Ernestina. Desculpe!

– Tudo bem! Agora durma um pouco, precisa se recuperar, logo a mãe de Joaquim estará aqui e não queremos que a veja tão debilitada.

Cobre a mulher e desce até a recepção, onde se encontra com Pietro.

– Como está Dona Catharine?

– Melhor! Melhor do que eu imaginava! Sabe, às vezes me pergunto se aquela fragilidade toda não seja uma capa para esconder sua real essência – comenta sua decepção com o rapaz. – Tenho a impressão de que, em algum momento da história, ela tenha se perdido, deixando de lado toda a amabilidade que possuía, para se tornar uma sombra daquele marido cruel.

O noticiarista não alcança o comentário.

– Será que posso vê-la? – muda de assunto.

– E o que pretende? Se for uma reportagem, esqueça!

– Não! Não trabalho mais no jornal, quero apenas vê-la. Posso?

– Vá! Vá!

– Ernestina, o doutor Jaime poderá esclarecer tudo! – ouve uma voz advinda do coração. – Será? – pergunta-se. – Pois vou checar isso agora!

No C.T.I, diante da mulher que dorme, Pietro arfa. Sente algo por ela, não sabe explicar, mas é lindo demais, assim como o crepúsculo que beija os montes verdes da região. Aproxima-se, passa de leve as mãos sobre os cabelos dela e pensa o quanto seria bom se ela estivesse em outro lugar, talvez em uma praça, diante de tantas flores. Ela não era uma criatura para jazer num leito; com sua beleza, até o Olimpo haveria de lhe dedicar um altar. Com o coração agitado, os olhos grandes e luzentes e os lábios umedecidos, assiste-a sem fazer o mínimo ruído. Que mulher era aquela que o desviava do caminho, fazendo-o voltar a esta terra corrompida por toda espécie de pecados? Seria ela um anjo em meio ao lodaçal das mazelas políticas? Meu Deus! Seja lá o que fosse, ela mexia com seus sentidos, a ponto de não poder discernir o sonho da realidade.

– O senhor precisa ir – avisa-o um enfermeiro. – Já terminou o horário de visitas.

– Você? – pergunta a mulher, acordando. – Veio me ver? Que felicidade!

Os olhos do homem espelham as luzes do paraíso.

– Olhos de jabuticabas em plena estação, fios de cabelo negros, finos, que descem da cabeça em voltas, como as ondas do mar... Você não mudou nada! – diz, demonstrando um cansaço.

– Poxa! É assim que me vê? – alegra-se.

Ela sorri.

– E como me vê? – arrisca-se a mulher.

– Não sei, talvez uma deusa...

– Deusa, eu? Se fosse, usaria todo o poder para estar em outro lugar, longe de doenças de todas as sortes, diante de alguém que pudesse me trazer algum tipo de paz.

– Posso ser este enviado?

– Como assim?

– Posso lhe trazer a paz de que deseja? Não sou nada, nem ninguém, apenas um cavaleiro errante, que anda pelo mundo à procura de justiça, de sonhos simples, de uma vida ao lado de quem sabe respeitar os mais íntimos devaneios... Impossível? Às vezes acho que sim!

– Por que me diz isso? Nem me conhece! Estou mo... mo... morrendo!

– Deusas são eternas! Apenas os corpos fenecem, mas as essências ficam para sempre...E a sua é contagiante! Por onde passa, deixa algo que atiça até os mais dormentes sentimentos da alma de um homem.

– Mesmo tão feia como estou, caída a esta cama, insiste em me comparar a uma deusa? Poxa! Deve estar sofrendo de algum distúrbio ocular – ri.

– Mil vezes esta doença a não poder vê-la.

– Nossa! O que deseja de mim?

– Desculpe se a deixei acanhada, mas não sei o que acontece comigo quando estou perto da senhora. Sinto uma paz de espírito, um calor que me corre às veias, entorpece minha visão e me faz enxergar tudo tão colorido. Não sei que nome dou a este sentimento, porque, como mesmo me disse, pouco a conheço; talvez o suficiente para saber que não é como outra mulher qualquer. A senhora é...

– Pietro... – interrompe-o a mulher –... este é o seu nome, não?

– Não esqueceu!

– Nem poderia! Você também me desperta um sentimento ainda desconhecido.

– Flor-de-Cera!

– CO-COMO? – assusta-se. – O que disse?

– A senhora me lembra uma flor-de-cera. Sua delicadeza... é... é incrível!

– Saia daqui! – pede, com veemência, lembrando-se de Joaquim.

– Vá! Quero ficar só!

– O que eu disse, senhora, que a deixou tão nervosa?

– Não disse nada, apenas preciso descansar.

– Vamos! Já disse, o horário de visitas terminou – relembra-o o enfermeiro.

– Desculpe, não quis magoá-la! Desculpe!

– Flor-de-cera – sussurra consigo mesma, ao vê-lo sair. – Não pode ser! Meu Deus! Outra vez não!

Ao encontrar o jornalista no corredor, Rubens cobra:

– O que de fato quer aqui, rapaz? Eu sei que uma reportagem, não é? Então...

– Doutor Rubens, sei que o senhor é o pai dela, as conversas estão correndo por toda parte e onde há fogo, há fumaça, não é?

– Digamos que sim!

– Estava nítido quando disse que os “Arraias eram fortes”.

– Sim... e...

– Acreditaria se eu dissesse que estou apaixonado?

– E por que não? O amor é assim, pega-nos sempre de surpresa.

– Pois uma flecha de Eros² me acertou!

– Está visível! Mas sabe que ela...

– Ela está partindo, não? Como posso ficar sem ela? Não consegui ir embora, por mais que quisesse.

– Nem conseguirá! Quando se ama de verdade, cada segundo longe é uma eternidade. Já passei por isso e só sei que é muito doloroso.

– Se eu pudesse, passaria todo o tempo ao lado dela.

– Isso não será possível! Pelo menos por enquanto! Mas há de amá-la de outra forma, rezando para que um milagre aconteça e ela se salve do que aparenta ser o inevitável.

– Mas... mas... nunca rezei! Aliás, Deus para mim... sei lá... sinto-o distante.

– Está errado! Quanto mais perto estamos do amor, mais perto estamos de Deus, porque o AMOR foi a forma que ele encontrou para que nós, simples mortais, nunca o esquecêssemos. Quando amamos, estamos ao lado dele, sentindo sua presença, porque diferentemente do que dizem, DEUS não é um pai qualquer, mas a força que nos move rumo a um destino adornado por flores-de-cera.

– Flor-de-cera!!! Foi assim que a chamei e ela ficou enraivecida do nada.

– O amor é belo, meu rapaz, mas não quer dizer que não deixe feridas. E as delas foram feitas pelos espinhos desta flor, se é que ela as possui.

– Um médico falando de Deus, de amor, de flor? O que há?

– Quando estamos apaixonados, a ciência perde o pedestal; em seu lugar, como um anjo, venerado pelos sentimentos mais belos e profundos, estará sempre aquele ou aquela que nos fará plenamente felizes, ainda que não saibamos por quanto tempo.

– Nossa! – exclama o jovem.

– Já estou indo! – Antes de partir, volta-se para Pietro: – Nada ainda está perdido! Acredite.

O rapaz senta a um banco, encosta a cabeça à parede e se perde nos mais lindos pensamentos.

– Quero a verdade, doutor! Sou toda ouvidos! – diz Ernestina, no escritório do doutor Jaime, a algumas quadras do hospital, frente a frente com ele.

– Do que está falando, criatura?

– Que história é essa de Dilermando ter alterado o testamento da família? Lembro-me bem do senhor ter ido à mansão antes da morte dele.

– E o que há de anormal nisso? Era meu cliente, aliás, o meu melhor cliente, de modo que, para que as empresas pudessem resistir à morte dele, foi necessário transformá-las em companhias anônimas, garantir a maior parcela das ações à família Dumont e estabelecer poderes limitados aos acionistas minoritários.

– O senhor mente!

– Como ousa entrar em meu escritório para me ofender?

– Vocês tramaram alguma coisa, eu sinto!

– Minha filha, vá tomar um banho de sal grosso. Tem sentido demais!

– Onde está o testamento dos Dumont?

– No cofre da residência deles!

– Não me refiro àquele, mas ao verdadeiro.

– Juro que não te entendo!

– Será? Pense direito!

– Saia daqui! Não tenho tempo para ideias maquiavélicas de uma plebe angustiada.

– Responda ao que ela está perguntando – exige Rubens, adentrando a sala.

– O que é isso aqui? – atemoriza-se o advogado. – Onde pensam estar?

– Queremos a verdade!

– Que verdade?

– Diga-nos tudo, Jaime! – determina o médico.

– Dizer o quê? E quem você pensa que é, Rubens, para entrar em meu escritório e exigir alguma coisa?

– EU SOU O PAI DE CATHARINE DUMONT, OU MELHOR, CATHARINE ARRAIA!

– Não pode ser! – o homem cai sobre a cadeira. – Você descobriu a verdade?

– Se não quer parar atrás das grades, cúmplice de um homem doente, que premeditou o fim da própria filha, há de nos contar tudo agora, porque depois que esta história vazar, ninguém lhe dará qualquer crédito. A notícia estará estampada em todos os jornais, as fofoqueiras levarão os fatos a todos os cantos da cidade e os empresários, aqueles que alimentam a sua roda financeira, também sumirão, porque ninguém gostará de ver seu nome ou o de sua empresa associado a um escândalo como esse. Por isso, pense bem! Diga-nos tudo! Por que Dilermando tramou contra a vida de sua, então, filha? Que prazer insano era esse?

– Ele nunca tramou contra a filha.

– Espere aí, se Catharine não era o seu alvo, quem o seria?

– O bastardo.

– Seu George Dumont? – espantam-se a empregada e o médico.

– Corrigindo, Jorge da Silva, porque George Dumont foi uma invenção de Dilermando, querendo esquecer-se do passado a qualquer custo – revela o advogado.

Encerra com a música (Om Mane Padme Hum - A Song to Heal the World - Marcus Viana).

__________________

1. É escritor, poeta, bacharel em Direito, advogado e articulista jurídico, nascido na cidade de Farias Brito, no Ceará, em 11 de junho de 1971. Mudou-se para São Paulo no ano de 1986.

2. O Deus Eros é o deus da paixão, do amor e do erotismo na mitologia grega. Sua principal função era unir as pessoas por meio de suas flechas mágicas. Esse deus representava o amor verdadeiro e na mitologia romana ele é chamado de cupido.

 


autor
Carlos Mota

A novela "Flor-de-Cera" é remake de "Venusa Dumont - da memória à ressurreição" de Carlos Mota
 
elenco
Grazi Massafera como Catharine Dumont
Thiago Lacerda como George Dumont
Ricardo Pereira como Joaquim
Elisa Lucinda como Ernestina
Carlos Takeshi como Tanaka Santuku
Miwa Yanagizawa como Houba Santuku
Jesus Luz como Pietro Ferrara
Lucinha Lins como Franceline Legrand Dumont
Lima Duarte como Dilermando Dumont
Herson Capri como Doutor Rubens Arraia
Tonico Pereira como Moacir
Werner Schünemann como Paineiras Ken
Rosi Campos como Adelaide
Humberto Martins como Alberto Médici
Cauã Reymond como Ricardo
César Troncoso como Zé dos Cobres
Ilva Niño como Josefa
Selton Mello como Zelão
Matheus Nachtergaele como Meia-noite
Caio Blat como Delegado de Vila Bonita
Caio Castro como Leandro
Alexandre Borges como Doutor Jaime
Caroline Dallarosa como Carmem
Fernanda Nobre como Stela

participação especial
Stênio Garcia como Doutor Lúcio
Drica Moraes como Desirê
Marco Nanini como Chico Santinho

atores convidados
Ary Fontoura como Doutor Tobias
Alexandre Nero como Júlio Avanzo
Elizangêla como Maria

a criança
Valentina Silva como Alana

trilha sonora
Lágrimas da Mãe do Mundo - Sagrado Coração da Terra (abertura)


desenhos
Andrea Mota

produção
Bruno Olsen
Cristina Ravela

Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO


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