Odilon e Tereza caminham por uma trilha no meio da mata. À medida que andam, a mata vai ficando mais densa. Tereza quebra o silêncio entre eles.
– Odilon, me explica de novo que eu não entendi. Por que só agora que ocê e o Alfredinho decidiram ficar de papo?
– A gente se conhecia pouco, mas nunca conversava. Nós conversamo e ficamo amigos, ué.
– Mas depois desse tempo todo morando aqui? – questiona, Tereza.
– É, ué. E tem hora pras pessoa virarem amigas?
– E por que você teve que combinar de pescar com ele justo na sexta?
– Mas Tetê, vamos fazer assim: o parque vai ficar mais uns vinte dias em Santa Inês. A gente vai depois, outro dia.
Tereza está triste.
– Mas ocê tinha prometido pra mim.
– Óia. Eu não vou levar ocê pro parque em Santa Inês não. Sabe pra onde eu vou te levar? Pra Ubatuba. Eu prometo.
Tereza sorri e abraça Odilon por trás.
– Eu te amo, sabia?
– Eu também te amo, Tetê.
Odilon e Tereza passam pela fina trilha na beira do precipício da Ribanceira da Cruz. Mais algumas centenas de metros e chegam até o tronco tombado. Andam mais um pedaço e, enfim, encontram o grande arbusto de samambaia. Alguns metros adiante, Tereza puxa Odilon para fora da trilha.
– Pra onde cê tá ino, Tereza?
– Óia só como o Pedro é malandro.
A poucos metros fora da trilha, Tereza e Odilon chegam até onde uma rede de balanço está amarrada e enrolada numa árvore. No tronco de outra árvore próxima, um galho está quebrado, para servir de gancho para a rede.
– Ele puxa a rede e engancha ali naquele galho quebrado.
Mostra Tereza.
– Seu Irineu pensa que ele fica vigiando; ele fica é dormindo a noite toda – diz Tereza.
– E se arguém vê?
– Quem vai vê, Odilon? De noite, no escuro.
– É. Mas ele tá se arriscando. Se arguém vê e dizê pro seu Irineu, ele vai ficar desempregado – avisa, Odilon.
Ao mexer na rede, Tereza derruba um pequeno cantil metálico. Ela abre; ainda há um restinho de aguardente dentro dele. Ela fecha a cara e mostra o cantil para Odilon.
– Eu posso explicar – diz, Odilon.
– Cê deu um cantil pra ele ficar bebendo no trabalho, Odilon?
– Ah, Tetê. Ele tava chateado de ter que ficar trabalhando direto, perdendo feriados, domingos. Ele viu esse cantil lá no loja, gostou, e eu quis agradar ele.
– Cê sabe que ele só tem esse emprego porque minha mãe pediu e o seu Irineu só deu por causa da amizade que tinha com meu pai, né? Se ele souber que o Pedro tá bebendo no trabalho, vai mandar ele embora, né?
– Mas não é nada demais, Tetê...
– Cê só deu o cantil pra ele ou ele te pede pinga também? – questiona Tereza.
– Ai, Tereza. Vamo logo pra cachoeira, vai acabar ficando tarde.
Tereza recoloca o cantil no lugar. Ambos retornam por onde vieram. Do local onde Pedro colocou a rede dá pra avistar a trilha, inclusive o grande arbusto de samambaia. Por estar num ponto mais alto e de mata fechada, Pedro consegue perceber caso alguém se aproxime pela trilha.
Odilon e Tereza caminham por mais trinta minutos em área de mata fechada. É o tempo que começam a escutar o barulho da cachoeira. Mais alguns metros e já estão de frente para ela. Enfim, os dois chegam no paraíso particular deles.
– Até que enfim. O melhor lugar de São Pedro da Cachoeira – diz Pedro, sorrindo e arrancando a camisa.
– Eu não entendo como seu irmão não gosta daqui – diz, Tereza.
– Ele é um brucutu, não gosta de nada. Trouxe ele uma vez aqui, veio reclamando o caminho todo e disse que a cachoeira não era nada demais, que as outras eram melhor – diz Odilon.
Só um ser ranzinza e infeliz como Odílio poderia não gostar de um lugar tão agradável como a cachoeira do Jaú. A explicação de muita gente não gostar pode ser a distância, mas a verdade é que Odílio não gostava de quase nada, além de dinheiro. A cachoeira do Jaú é uma queda d’água de cerca de 15 metros de líquido límpido e puro, formando uma grande piscina natural. Pelo lado direito, o riacho corre, até se encontrar com o Rio Delgado, cerca de 20 quilômetros dali, e não muito longe da outra estrada que sai da cidade, em direção a Minas Gerais, seguindo pela Serra da Mantiqueira. Da outra saída da cidade, um caminho, uma trilha muito melhor e mais segura do que a da cachoeira do Jaú, leva até o ponto do Rio Delgado, onde a população costuma pescar com frequência. Pela trilha, com 20 minutos se chega até lá. Ali é o local onde Odilon planejava levar Alfredinho na sexta-feira para ser assassinado.
Esquecendo-se completamente do seu compromisso de sexta-feira, Odilon mergulha na piscina natural só com uma cueca samba-canção. Tereza estreia o maiô que ganhou de presente do namorado. Ela chega até a beira e mergulha. Eles se abraçam e se beijam.
Tereza
direção
Carlos Mota
Cristina Ravela
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