CAPÍTULO 01
17 de Maio de 2015 – 22h30
Uma mulher, de aproximadamente
quarenta e cinco anos, trajando um vestido branco, com contornos pretos, um
pouco acima do joelho, caminha pelo espaço externo do salão de eventos. Sua
expressão facial, indicando estresse, muda ao enxergar outra mulher.
– Boa noite querida! Pensei
que me deixaria na mão. – A anfitriã do evento se aproximou de Lana.
–Estava aqui há duas horas. Estou
fugindo da fúria do Guilherme. – A convidada olhou para os lados, preocupada. –
Enfim. Você disse que havia alguém para me apresentar?
– Sim. Ela está conversando com
alguns empresários perto da fonte de água. Vá até lá. Tenho que recepcionar
alguns convidados.
– O.k. Até mais.
– Até nunca mais, Lana Albuquerque! –
Seu sorriso falso transformou-se, em poucos segundos, numa risada diabólica.
Dois empresários observavam Lana se
aproximar da figura a frente deles. Logo, cessaram a conversa e afastaram-se,
dirigindo-se onde os convidados permaneciam.
– Boa noite. Chamo-me... – A pessoa
virou-se para a juíza. – Você?! Que brincadeira é essa? – Esperava pela
resposta. – Não vai falar? Você quer dinheiro? – A criatura, usando uma capa
preta para não ser reconhecida negou com a cabeça, retirando do disfarce, uma
grande faca afiada. – Você não sabe com quem está se metendo! Eu posso... – O
pescoço de Lana fora cerrado com o braço esquerdo de quem estava a sua frente.
A juíza tentou defender-se, e gritos puderam ser ouvidos. Num ato brusco, Lana
ajoelhou-se ao gramado. Observou sua barriga: jorrava sangue. Seu pescoço fora
pressionado pelas mãos do indivíduo. Em poucos segundos, ela estava morta.
Perto dali, onde os convidados
permaneciam, todos sorriam, brindavam e comemoravam, como se nada tivesse
acontecido.
MAIO DE 1995
Uma jovem, de aparentemente vinte e
cinco anos, entra numa das salas da universidade e observa um homem, de
cinqüenta anos, explicar um dos conteúdos que cairá na próxima avaliação. O
primeiro horário da aula termina, e os alunos são dispensados.
– Pensei que você não iria vir hoje.
Estava tão pálido ontem... – A bela jovem fechou a porta e beijou seu pescoço.
– Não faça isso, Lana! Alguém pode
entrar.
– Quem? Estamos a sós nessa sala! –
Lana abraça o professor e observa seu crachá: Maurício Almeida. Os dois
mantinham um relacionamento em segredo há dois meses. O professor era casado e
tinha uma filha de três anos. Ela sustentava um casamento por aparência.
– O que você quer? – O professor foi
direto. Guardava seus materiais numa bolsa preta, prestando pouca atenção na amante.
– O que eu te pedi há um tempo. A
Fernanda precisa sumir da minha frente! De qualquer forma. Seja ela sendo
expulsa, morta ou ganhando outra oportunidade na vida.
– E você quer que eu me meta nisso? –
O professor olhou para a aluna. – Não sei o porquê da rivalidade entre as duas,
mas não me meta nisso!
– Você é meu amante. Se ela descobrir
que estamos juntos...
– Essa seria outra história, iria me
envolver também. Mas eu dar um jeito na Fernanda por algo que aconteceu entre
vocês duas? Não. – Maurício fitou a aluna outra vez e saiu da sala com uma
expressão de irritado.
***
Uma pequena casa, localizada a trinta
quilômetros da universidade servia de moradia para Marta Amorim e sua filha,
Fernanda. A mulher perdera o marido numa troca de tiros com outro vizinho, o
qual saiu ileso de quaisquer acusações. Desde então, é sustentada pela única
filha.
Marta, com o dedo indicador, desliga
uma cafeteira e retira a jarra, distribuindo o líquido em pequenas xícaras
brancas, enquanto conversa com a filha.
– Já lhe disse o que penso sobre esta
sua amiga, Fernanda. Pessoas como ela não pensam no outro, apenas em si mesmos.
– Ela sentou-se na cadeira, apoiando seu braço na mesa da cozinha. Seu avental
branco com manchas amarelas lembrava seu esforço e trabalho. Sua pele era
branca, mas com a idade, rugas e manchas foram surgindo.
– A Lana é uma boa pessoa. Isso eu
garanto. Mas algo me diz que ela sente nojo das pessoas de outras classes
sociais, como eu. – Fernanda afirmava, com a cabeça baixa.
– Eu criei você da maneira mais
humilde possível. Passei fome para lhe dar o que comer. Entrou na universidade
por mérito seu. Não deixe ela destruir seus sonhos, minha filha.
– Ela não teria coragem, mamãe...
– Ah, teria! Trabalhei por muitos
anos em famílias como a desta sua amiga, a Lana. E acredite: todas me tratavam
como uma empregada qualquer. E mais: faziam questão de me humilhar. Acredita na
sua mãe, Fernanda. Esteja preparada para situações desconfortantes.
***
Um homem, com pouco menos de trinta
anos, está sentado a uma poltrona, folheando um jornal. Lana abre a porta pelo
lado de fora e entra afobada dentro do apartamento.
– Bom dia, meu amor. Pensei que
estivesse no escritório. – Lana sentou-se no encosto da poltrona e beijando o
marido.
– Decidi tirar folga hoje. Por que a
afobação? Está nervosa... – Carlos Henrique fechou o jornal, dobrou-o e o
colocou sobre a mesa de centro.
– Impressão sua, querido.
– Se não há nenhum problema, eu vou
dar uma saída rápida.
– Até quando, Carlos Henrique? Você
foge de mim como uma criança corre depois de tocar a campainha. Poxa, se não
está feliz comigo, pode falar.
– Você sabe que nosso casamento é
apenas por interesse. Não existe amor.
– Como não? Você afirmou na igreja...
– Afirmei porque achei que me amasse
de verdade, Lana! Logo na lua de mel, você veio com o papo de ter um filho. Até
um burro sacaria o que pretende.
– Veja como fala comigo! Eu desejo
ter um filho com você...
– Não lhe dou um centavo, quem dirá
um filho! Aposto que essa criança ficará atirada nos cantos, nos braços das
empregadas, só para você poder usá-lo contra mim!
– Cachorro! Veja o que fala!
– Nossa união é por aparência. Mas
caso eu descobrir que você anda me traindo, eu te mato, ouviu? – Pegou as
chaves do carro. – TE MATO! Com licença.
***
Uma mulher, de quarenta e oito anos,
vestindo uma camisola de seda longa e branca com um robe, está sentada a uma
penteadeira. Ela penteia seus fios grisalhos lentamente. Pousa a escova em
frente ao espelho e levanta-se, com a mão esquerda na testa, sentando-se na
cama.
Um homem, usando um paletó, bate na
porta e entra. Sua expressão é de preocupação.
– Beatriz? – Ele observava a mulher
ingerir duas cápsulas de remédio. – Como passou a noite?
– Mal. Como sempre, Roberto. –
Beatriz levantou-se, quase sem força. – Antes de sair, chame o advogado.
Preciso resolver os últimos detalhes do testamento.
– Outra vez essa história, Beatriz?
Pare de pensar nos seus filhos pelo menos um minuto, você não está bem,
descanse. Quando estiver disposta eu penso em chamá-lo.
– VOCÊ NÃO ESTÁ ENTENDEDO! – Gritou.
– Eu sei que estou morrendo, Roberto. Não adie a sua dor. Desista!
– VOCÊ NÃO VAI MORRER! – Roberto
sentou-se a frente de sua esposa. Ela baixou a cabeça e desfaleceu em seus
braços. – Beatriz? Acorda!
***
O homem andava de um lado para o
outro, enquanto dois jovens, um garoto de vinte e um anos, com expressão de
nervosismo, balançando as pernas, com as mãos unidas encostadas na boca e uma
garota, de vinte e cinco anos, com as pernas cruzadas, despreocupada, vendo
noticiário na televisão.
O médico se aproxima dos três. O
garoto levanta-se, e o homem para de andar. A garota continua no mesmo lugar,
sem perceber a presença do médico.
– Como ela está doutor?
– A doença se espalhou por todo o
corpo. Podemos testar tratamentos alternativos, mas é pouco provável que ela se
recupere.
– Ela é um paciente terminal? – O
jovem garoto limpou as pequenas lágrimas que escorriam de seus olhos.
– Infelizmente... Sim. Não há muito
que fazer. E para um melhor atendimento, ela ficará internada no hospital.
– Podemos visitá-la?
– Ela está sedada, num sono profundo.
Aconselho deixá-la descansar. Qualquer coisa estou aqui. Tenham um bom dia. - O
médico pegou o estetoscópio que estava em volta de seu pescoço. – Com licença.
***
Lana Albuquerque adentra na sala de
aula, alguns minutos antes que os demais alunos. Ela abraça o professor por
trás, o surpreendendo.
– Você está louca? Se alguém entra
aqui...
– Relaxa. Ainda está cedo. O meu
assunto é outro: Fez o que lhe pedi?
– Não! Lana, qual a parte que você
não entendeu? Eu tenho uma filha, sou casado... NÃO! Que se meta nessa história
sozinha.
– Você vai... – Lana ficou nervosa.
– Eu gosto de você, como aluna e como
amante. Se a Fernanda for fazer algo contra a MINHA reputação, eu posso até
matá-la. Mas seja racional, eu me meter na história que interessa apenas a
vocês... Chama o seu marido, se quiser um homem na equipe.
– Carlos Henrique é tão frouxo como
você está sendo agora! – Bateu a mão na mesa e virou-se, sendo surpreendida por
um beijo.
– Eu te amo querida. Não fique brava,
a solução pode estar mais perto do que imaginas. – Selaram a paz com outro
beijo.
Os dois não imaginavam, no entanto,
que Fernanda havia escutado tudo, e visto a aproximação do casal. Sua
expressão facial era de raiva, queria destruir a imagem da amiga. Caminhou
até um bebedouro. Pegou um copo plástico e o encheu com a água, bebendo o
líquido em um só gole. Respirou fundo e começou a pensar em algo.
– Essa garota brincou com fogo! – Sua
mão esquerda apertou com força o copo plástico, e o pouco líquido que havia
escorria e pingava no chão.
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